Ousados, os químicos e plásticos de São Paulo sempre foram além dos limites
da atuação sindical; por isso, têm presença efetiva nas mobilizações sociais e
na vida política do país
Fundada em agosto de 1983, os passos iniciais de organização da CUT, Central
sindical que hoje é a quarta maior do mundo, foram dados na sede do Sindicato
dos químicos de São Paulo. Em março de 1981 acontece o 1º ENCLAT (Encontro da
Classe Trabalhadora), que veio a ser a seção estadual paulista para a realização
do 1º CONCLAT (Conferência Nacional da Classe Trabalhadora), realizado cinco
meses após o evento estadual, em Praia Grande, reunindo mais de cinco mil
trabalhadores das mais diversas categorias.
É verdade que naquela época o Sindicato ainda era controlado por pelegos, que
agiam segundo seus interesses pessoais e em favor dos patrões. Mas naquele
momento já marcava forte presença a oposição sindical que resgatou a entidade
dos trabalhadores para atuar em defesa da categoria. Em 1982 vence as eleições
sindicais, acaba com mais de duas décadas de peleguismo e consolida-se como
referência estadual e nacional de lutas. Apóia diversas oposições sindicais
Brasil afora para a derrubada de pelegos de outras categorias. Tem atuação
decisiva na fundação da CUT, participa ativamente dos grandes embates políticos
e sindicais que consolidam a derrubada da ditadura militar, em 1985.
Se os químicos de São Paulo retomaram seu sindicato em 1982, três anos depois
asseguram a reeleição e ainda têm atuação de destaque no apoio à então oposição
dos plásticos, que também vence as eleições em 1985. Era o início da trajetória
que resultou na unificação dessas duas categorias, em 1994, numa única entidade
sindical, como já era no passado.
Os químicos e plásticos de São Paulo, desde 1983 e sobretudo a partir de 1994
com a unificação da categoria tornam-se referências de atuação sindical na
capital paulista, no Estado e em nível nacional. E vão mais além estabelecendo
contatos com entidades sindicais de outros países na troca de experiências,
sobretudo em relação às lutas e conquistas dos trabalhadores em empresas
multinacionais do ramo químico.
Campanhas Salariais
Ainda como duas entidades sindicais distintas, os químicos e plásticos de São
Paulo e região ousam e saem na frente com a proposta de que as categorias
promovam campanhas salariais unificadas. Era o rompimento, na prática, com os
limites impostos pelos patrões e o então governo da ditadura militar. E a
campanha salarial de 1985 entra para a história, sobretudo pela sua capacidade
de mobilização, além das conquistas. Por exemplo: a redução da jornada de
trabalho para 44 horas semanais, que se tornou lei na constituinte de 1988, foi
conseguida três anos antes pela categoria.
Desde então, todas as campanhas salariais, ano após ano, são unificadas,
envolvendo diversas categorias do ramo químico sob coordenação da CNQ-CUT. Cada
momento com suas particularidades, o fato é que em todas elas os químicos e
plásticos de São Paulo estão à frente não somente porque representam a maior
base sindical deste ramo de atividade, mas sobretudo porque acumularam
experiências nessa forma de atuação sindical que em muito fortalece a luta dos
trabalhadores.
Várias são as conquistas da categoria ao longo desses anos. Mas também merece
destaque a capacidade de resistência e determinação da direção sindical, como
ocorreu em 1998, ano em que os químicos e plásticos de São Paulo se negaram a
assinar uma Convenção coletiva cujo conteúdo apontava para a redução de direitos
e até eliminação de conquistas dos trabalhadores. Este Sindicato, aliás, é um
dos poucos do Brasil que nunca cedeu um milímetro sequer nessas questões.
Atos e atitudes
Uma das primeiras categorias a compreender que a atuação sindical vai além
das lutas por melhores salários e mais empregos, os químicos e plásticos sempre
somaram esforços com outros trabalhadores nas manifestações de primeiro de maio.
Ao lado do importante significado desta data e justa homenagem aos que lutaram
no passado, a comemoração é referência mundial. Sobretudo a partir de 1994,
depois da unificação, a categoria é uma das principais protagonistas das
manifestações do dia internacional do trabalhador na Capital paulista e grande
São Paulo.
Parte dos químicos e plásticos de São Paulo, por exemplo, a iniciativa de
levar as manifestações do primeiro de maio ao trabalhador e sua família, em
locais próximos onde mora. Assim vem acontecendo, com a realização de atividades
diversas nos bairros, nesta data e na semana que antecede para que o dia
internacional do trabalhador alcance a maior dimensão possível, atingindo
corações e mentes pelo seu significado e pela necessidade de lutas.
Atentos aos acontecimentos no campo da política, em 1984, nas grandes
mobilizações e manifestações por eleições diretas para presidente, os químicos e
plásticos também tiveram papel de destaque. Depois, na Constituinte, de 1988,
novamente os químicos e plásticos marcam presença, seja nas mobilizações, seja
na pressão junto aos parlamentares e mesmo na apresentação de propostas.
Enfim, não há um só momento da história recente do Brasil que esta categoria
não tenha tido participação direta. Um dos fatos marcantes foi o fora Collor, de
1992. Já na era FHC, a partir de 1994, os químicos e plásticos denunciaram o
plano Real, cuja estrutura de controle da inflação amparava-se num brutal
arrocho salarial e política recessiva que causava desemprego crescente. Em 1997
participa da marcha dos 100 mil a Brasília. Um ato de protesto contra a política
econômica de Fernando Henrique e sua turma.
Política e social
Os químicos e plásticos de São Paulo vão adiante em sua luta por uma
sociedade justa, solidária, sem exploração. Em busca dessa conquista não medem
esforços na atuação sindical, seja nas lutas da categoria, seja nos desafios
gerais da classe trabalhadora, ao lado de outros sindicatos, da CUT e demais
entidades em torno de questões específicas, mas tendo como objetivo maior o
socialismo como a mais efetiva alternativa de um mundo melhor para todos.
Além da ação sindical, os embates de ordem política. A definição e
posicionamento firme em momentos eleitorais e, principalmente, a atuação nos
níveis institucionais, ou seja, na necessária pressão junto a governos
(municipal, estadual e federal) e parlamentares (vereadores, deputados
estaduais, federais e senadores) para que sejam aprovadas leis de interesse dos
trabalhadores, na apresentação de propostas que nascem das experiências de lutas
da categoria, ou mesmo para garantir nossos direitos e conquistas.
Só para citar um exemplo: um certo candidato a prefeito da cidade de São
Paulo diz em sua propaganda eleitoral que é o pai do genérico. Uma grande
mentira. Já no final dos anos 1980, os químicos e plásticos de São Paulo tomaram
a iniciativa de abrir o debate sobre a implantação do medicamento genérico no
país. Na época, governo federal, muitos parlamentares e sobretudo as grandes
multinacionais do setor não queriam nem ouvir falar a respeito.
Com o apoio de parlamentares petistas os químicos e plásticos de São Paulo
formularam uma proposta nessa direção. O ex-deputado do PT paulista, Eduardo
Jorge, médico sanitarista, aprimorou na técnica, deu texto final e apresentou na
Câmara Federal como projeto de lei, que só foi aprovado em 1993. Depois, ainda
faltava o então Presidente da República sancionar a lei e regulamentá-la.
Atendendo a interesses dos laboratórios farmacêuticos multinacionais, enrolaram
e adiaram o máximo possível, apesar de toda a pressão social pela aprovação
imediata. Só colocaram em prática a partir de 1999; e ainda querem sair de
bonzinhos agora.
Era dos Fernandos
Ápice do movimento pela democratização do país, em 1989 o povo brasileiro vai
às urnas para eleger o presidente da República. Eleições diretas, depois de 25
anos. Entre as várias candidaturas da época, duas surpresas para o segundo
turno. De um lado, Fernando Collor de Mello, um nefasto governador do Estado de
Alagoas, filhote pródigo da ditadura militar. De outro, a candidatura LULA, um
fenômeno político, uma evidência clara de que o Partido dos Trabalhadores,
fundado em 1981, veio para disputar para valer o poder com as elites.
LULA e o PT, com apoio dos químicos e plásticos de São Paulo e todos os
sindicatos filiados à CUT e demais segmentos sociais progressistas, perderam por
uma diferença muito pequena para Collor, que contou com a fortíssima ajuda da
grande maioria dos empresários e, principalmente, dos meios de comunicação com
suas muitas manipulações.
O resultado deste primeiro Fernando na presidência foi o confisco da poupança
da população, um mar de lama de corrupção e seu impeachment na metade do
mandato, em decorrência de ampla mobilização social, da qual os químicos e
plásticos de São Paulo participaram. Em 1992 o vice, Itamar Franco, assume e
leva FHC para ser ministro. Aliás ele já queria isso desde o início do mandato
de Collor de Mello, só não foi porque Covas vetou.
Diante do escândalo Collor, LULA consolidava-se cada vez mais como
alternativa de governo nas eleições de 1994 para presidente. De novo as elites
se anteciparam na manobra, criaram regras restritivas para a disputa eleitoral
para prejudicar o PT e implantaram o Plano Real. Mais uma vez os químicos e
plásticos de São Paulo, ao lado de outras categorias saíram às ruas para
denunciar a falcatrua. A inflação foi controlada, é verdade, mas a um custo
social jamais visto no país, com arrocho salarial brutal e crescentes índices de
desemprego.
FHC em cena
O sociólogo Fernando Henrique encantou-se com o poder. Diferente do atual
governo LULA, cujas viagens ao exterior têm como principal objetivo a promoção
de relações diplomáticas e comerciais, FHC fazia verdadeiro turismo mundo afora.
Ele só queria aparecer, se mostrar como estadista. Enquanto isso, o Real
protagonizava uma das maiores recessões do país. O governo do Fernando 2º reagia
com forte pressão o movimento sindical que ousava reivindicar perdas salariais.
A exemplo da ditadura militar, fez intervenção no sindicato dos petroleiros de
São Paulo.
No reinado Fernando 2º ficou célebre a frase não rouba mas deixa roubar. E
aí surgem escândalos como o caso SIVAM (Sistema de Vigilância da Amazônia), cuja
licitação teria sido dirigida para favorecer uma empresa norte-americana. A
Pasta Rosa, conhecida por conter documentos que comprometeria a idoneidade do
governo FHC e o famigerado PROER, uma espécie de ajuda aos bancos privados com
dinheiro público. Mas nada foi apurado, apesar dos protestos da oposição e da
pressão dos movimentos sociais.
O mais drástico, no entanto, ficou por conta das privatizações feitas no
governo FHC. Empresas públicas, principalmente da telefonia, eram entregues para
grupos estrangeiros a preços sempre abaixo do valor e ainda, em geral, com
recursos do BNDES. De novo, nada foi apurado, a imprensa calou-se. Aconteceu
algo como você vender um carro, mas o comprador usa o seu dinheiro e não o dele
para pagar.
Sede de poder
Um certo ministro de FHC, Sérgio Motta, saiu com a história de que o projeto
dos tucanos era ficar 20 anos no poder. Surge daí a aprovação da emenda que
permite reeleição para presidente. Na Câmara Federal alguns deputados federais
chegaram a admitir que receberam 200 mil reais para aprová-la. Perderam o
mandato por corrupção, mas quem corrompeu, que também faz parte do crime, nunca
apareceu. De novo os meios de comunicação, com raras exceções, não se
preocuparam em apurar os fatos.
FHC e sua equipe econômica insistiam na farsa da paridade entre o real e o
dólar. Ganhou a eleição em cima de uma suposta estabilidade econômica que
resistiu poucos meses após o processo eleitoral. Em fevereiro de 1999 uma grave
crise se abateu, o real desmontou e a recessão aumentou ainda mais. A partir daí
o crescente desgaste do governo FHC foi uma constante, até a vitória de LULA, em
2002, quando derrotou Serra, que era o candidato dos tucanos.
São 15 anos de história política, que revelam o potencial de manobra da
elite. Nesse período, os químicos e plásticos de São Paulo sempre marcaram
presença, protestando, denunciando, apontando, ao lado da CUT, propostas e
reivindicações que assegurassem melhores dias para toda a classe
trabalhadora.
Com a eleição de LULA, em 2002, os químicos e plásticos mantém acesa a
esperança de que isto representa um grande passo para a conquista de um Brasil
melhor para todos. Mas não abre mão da autonomia de seu Sindicato de classe, de
sua independência para reivindicar e contestar sempre que entender que seja
necessário. É assim, na prática, que se constrói a liberdade e autonomia
sindical e, principalmente, um país com a tão sonhada justiça social.
Matéria publicada na Revista Especial 10 anos de Unificação, de
10/09/2004