Desemprego sobe a 11,5% e atinge 11,8 milhões de pessoas, em média, em 2016

O Brasil fechou 2016 com 11,8 milhões de desempregados, em média, o que representa um aumento de 37% na comparação com 2015, quando eram 8,6 milhões. É o maior registrado pela pesquisa, que começou a ser feita em 2012. 

A taxa de desemprego no ano passado foi de 11,5%, em média, também a maior desde 2012. Em 2015, a taxa média de desemprego havia sido de 8,5%.

Os números são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua e foram divulgados nesta terça-feira (31) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). As informações são coletadas em 211.344 domicílios, em cerca de 3.500 cidades.

12,3 milhões de desempregados no 4º trimestre

Somente no quarto trimestre de 2016, o Brasil tinha 12,3 milhões de desempregados, segundo o IBGE, o maior número desde 2012. É um aumento de 2,7% na comparação com o terceiro trimestre, e de 36% em relação ao mesmo período de 2015.

Confira a comparação com resultados anteriores:

  • no terceiro trimestre, havia sido de 12 milhões;
  • no trimestre de setembro a novembro, havia sido de 12,1 milhões;
  • um ano antes (quarto trimestre de 2015), havia sido de 9,1 milhões.

A taxa de desemprego de outubro a dezembro atingiu 12%, a maior registrada pela pesquisa desde 2012. 

  • no terceiro trimestre, havia sido de 11,8%
  • no trimestre de setembro a novembro, havia sido de 11,9%
  • um ano antes (quarto trimestre de 2015), havia sido de 9%.

Rendimento cai em 2016

Na média anual, o rendimento médio real (ajustado pela inflação) dos trabalhadores caiu 2,3% entre 2015 e 2016, de R$ 2.076 para R$ 2.029. 

No quarto trimestre de 2016, o rendimento dos trabalhadores foi de R$ 2.043. Apesar de maior do que no terceiro trimestre (R$ 2.026) e do que no mesmo período de 2015 (R$ 2.033), o resultado é considerado estável pelo IBGE nas duas comparações.

Cartilha do Dieese mostra necessidade de correção do Imposto de Renda

Em busca de uma tributação mais justa para o Imposto de Renda, o Dieese elaborou a cartilha “A progressividade na tributação brasileira, por maior justiça tributária e fiscal”. Em entrevista à Rádio Brasil Atual hoje (27), a coordenadora de pesquisas do Dieese, Patrícia Pelatieri, afirmou que a correção da tabela de Imposto de Renda é necessária.

“Atualmente, o Imposto de Renda tem cinco faixas de tributação, mas considerar quem ganha R$ 8.000 e quem ganha R$ 30.000 ter a mesma taxação continua deixando a tabela bastante injusta. A proposta das centrais sindicais é de correção da tabela de Imposto de Renda e a ampliação das faixas de alíquotas”, explicou.

Segundo ela, de 1996 a 2016, corrigindo pelo índice do IBGE, a defasagem acumulada na tabela de cálculo do imposto de renda das pessoas físicas é de 83,2%. “Se nós considerarmos somente o período de 2011 a 2016, essa defasagem chega a 18,67%, muito maior que a inflação. Ou seja, além de perder o reajuste conquistado pelas categorias, há uma perda real.”

Patrícia afirma que a política tributária é essencial para a distribuição de renda no Brasil. “É necessário que o sistema tributário tenha como princípio a progressividade na forma de incidência, ou seja, significa que quanto maior for a capacidade contributiva, mais alta é a tributação. A experiência internacional comprova que os impostos indiretos – como por exemplo, o ICMS e o ISS – podem ser repassados para o produto, então, eles não são aplicados na progressividade porque todos, independentemente da renda, pagarão a mesma coisa.”

Ouça a entrevista na íntegra: 

Reforma da Previdência será o estopim da rebeldia popular

Se ainda faltavam argumentos para convencer a população de que o governo Temer deve ser combatido, não faltarão mais. Na opinião do presidente da CUT, Vagner Freitas, a proposta de reforma da Previdência será “o estopim da chama que vai levar o povo para as ruas”.

“É só dizer claramente: vão acabar com sua aposentadoria”, afirmou Vagner, durante sua participação no seminário “Em Defesa do Direito à Aposentadoria para Todos”, realizado em Brasília nesta sexta, dia 27, por iniciativa da Fenae e da Anapar – Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal e Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão.

Vagner disse que a CUT vai procurar a “CTB, a Intersindical, a Frente Brasil Popular e a Frente Povo sem Medo e todas as entidades de esquerda” para chamar uma mobilização para a primeira quinzena de fevereiro. E acentuou: “A CUT não reconhece este governo e não negocia com ele. Não vamos discutir Previdência com este governo”.

Fundo privado não resolve

Tanto a Fenae quanto a Anapar, promotoras do seminário, representam trabalhadores que possuem fundos de previdência complementar. Aparentemente, não há porque se preocuparem com a retirada de direitos do chamado regime geral da Previdência Pública, pelo menos se levado em conta o discurso predominante na imprensa, que apregoa os fundos privados como panaceia para as futuras gerações.

Porém, não é o que pensa o presidente da Fenae, Jair Pedro Ferreira, trabalhador da Caixa Econômica Federal e ele próprio beneficiário do Funcef (Fundação dos Economiários Federais), terceiro maior fundo de pensão complementar do Brasil.

“Como o nome já diz, é complementar. O restante da nossa aposentadoria depende da Previdência pública”, explica. “E mais importante é lembrar que a família de quem tem plano complementar, a comunidade ao redor e ele próprio dependem do sistema público”, completa o bancário. “Previdência é um instrumento amplo, que inclui atendimento médico, e todo mundo vai precisar dela em algum momento”.

Além disso, lembra o dirigente, num cenário de desemprego crescente cai o número de contribuintes dos fundos de pensão, o que vai gerar rendimentos reduzidos para quem quiser se aposentar lá na frente. “Isso sem falar naqueles tantos que simplesmente não vão poder contribuir e não terão nada na idade avançada”, pondera.

Poupança nacional

Outra coisa que a mídia finge ignorar é que a Previdência pública, por se tratar de um fundo, compõe a chamada poupança nacional, instrumento importante para qualquer país poder navegar, em tempos bons ou ruins, e manter a economia equilibrada.

“Não se pode deixar tudo nas mãos dos bancos. Veja o caso dos Estados Unidos. Quando o sistema financeiro entrou em colapso, quem teve que salvar o país foi o Estado”, argumenta Jair. E os Estados Unidos têm uma diferença nada desprezível: eles podem imprimir dinheiro à vontade, já que o dólar, única moeda permitida no comércio internacional, é propriedade do banco central estadunidense.

Bancário: espécie em extinção

Vagner Freitas, trabalhador do Bradesco, alertou a plateia de aproximadamente 200 bancários presentes ao seminário: “Não haverá categoria bancária nos próximos anos se a gente não resistir”. Para ele, a terceirização e as reformas pretendidas por Temer e sua corte, mais a privatização de patrimônios como a própria Caixa, extinguirão a figura do bancário e da bancária.

Sobrou também para a elite brasileira: “Nossa elite é borra-botas da elite internacional. Não tem amor próprio”. O presidente da CUT destacou igualmente que o golpe, se não interrompido, tende a se aprofundar. “O que eles querem é vender o Brasil a preço de banana”.

O jornalista Luis Nassif, a pesquisadora Denise Lobato Gentil e o advogado José Eymard, consultor jurídico da CUT, participaram do debate.

Governo Temer distorce cálculo para alegar déficit da Previdência, aponta economista

O governo federal divulgou ontem (26) dados que apontam que a Previdência registrou, em 2016, déficit de R$ 149,73 bilhões, o que representaria um aumento de 74,5% em relação ao ano anterior, além de que esse “rombo” representaria 2,4% do PIB. Contudo, economistas, sindicalistas e pesquisadores seguem afirmando que o déficit não existe, porque se trataria de um cálculo distorcido.

A diferença se dá porque aqueles que enxergam o déficit observam apenas a relação entre o total de gastos com as aposentadorias e o valor arrecadado através da contribuição dos trabalhadores e empregadores. Mas, alertam esses estudiosos, não a análise não pode se basear apenas nisso. 

Segundo a economista Marilane Teixeira, do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), os gastos com a Previdência fazem parte do orçamento da chamada seguridade social, composta ainda pela Saúde e pela Assistência Social. 

Já as receitas que atendem às despesas da Seguridade Social vão muito além das contribuições de trabalhadores e empregadores. Fazem parte também a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS/Pasep, além de parte da arrecadação com loterias federais. 

“Quando se somam todos as receitas da Seguridade Social, o balanço tem sido superavitário, inclusive nos anos de crise, diferentemente de quando se olha apenas o orçamento da Previdência do ponto vista da contribuição patronal e do trabalhador, que, no caso do setor urbano, é superavitário também. Ele é deficitário quando você inclui o setor rural, mas isso foi uma decisão que se tomou na Constituição de 1988, porque era fundamental incluir a população de trabalhadores rurais no sistema de Previdência Social”, afirma a economista, em entrevista nos estúdios do Seu Jornal, da TVT. 

Para o ano de 2015, por exemplo, enquanto sob a ótica do governo o déficit foi da ordem de R$ 85,81 bilhões, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) afirma que a Seguridade Social teve superávit total de R$ 11,1 bilhões. Em anos anteriores, fora do contexto de crise, esse saldo foi ainda maior.

Marilane Teixeira atribui à política de desoneração da folha de pagamento das empresas, opção adotada desde o governo anterior no combate aos primeiros sinais da crise econômica, como um dos fatores da deterioração das contas do Seguridade Social. 

Segundo ela, ao insistir na ideia de déficit da Previdência, o governo pretende assinalar ao mercado que supostamente tem controle sobre os gastos públicos. Outra alternativa para reforçar as contas da Seguridade Social, segundo a economista, é combater a sonegação. Segundo dados de auditoria promovida pelo Ministério do Trabalho, só em 2016, as perdas com sonegação somaram cerca de R$ 60 bilhões.

Segundo dados da ONU, a evasão total de divisas e a sonegação fiscal de empresas brasileiras chegam a 27% do total que o setor privado deveria pagar em impostos no Brasil, equivalente a cerca de R$ 500 bilhões, o que cobriria com folgas o “rombo”.

Aos 94 anos, Previdência nunca esteve tão em risco

A Previdência Social completou 94 anos nesta terça-feira (24), data em que se celebra também o Dia dos Aposentados. Para marcar a data, a CUT promoveu um seminário em sua sede, na capital paulista, para tratar da sobrevivência do regime diante dos seguidos golpes do governo golpista de Michel Temer (PMDB).

Para o presidente da Fenapi (Federação Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos), Wilson Ribeiro, ao atacar o poder de compra dos inativos, o governo reforça a opção de tesourar a economia ao invés de incentivá-la.

“Desvincular o aumento do salário do aumento da economia é um erro terrível, porque, quando o governo passou a dar aumento real, o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu. O aposentado passou a comprar porque precisava, devido aos anos de defasagem acumulados. Queremos aquilo que pertence a nós, aquilo que é fruto da nossa contribuição durante anos”, afirmou.

Mais do que pensar na economia, o secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre, ressalta que a preocupação de Temer é fazer um contraponto ao modelo de desenvolvimento com inclusão dos mais pobres capitaneado pelo ex-presidente Lula e pela presidente eleita Dilma Rousseff.

“A grande diferença entre nós e os golpistas é que para nós o pobre passaporte para mudarmos o país, fazermos crescer por meio da inclusão economia, nas universidades. Estão desmontando todas as políticas sociais porque não deram golpe para que conseguíssemos voltar em 2018, mas para que fiquem 20, 30 anos no poder.”

O dirigente defendeu que a direção do golpe pela capacidade de reação da classe trabalhadora. “O golpe de 1964 aconteceu porque a classe trabalhadora não reagiu. Precisamos construir a unidade de todos os trabalhadores, inclusive os aposentados dentro da CUT. O que está vindo aí só se enfrenta se houver unidade.”

Visão equivocada

Secretário de Administração e Finanças da Central, Quintino Severo, também apontou que o fim da Previdência, junto com a reforma trabalhista, representa uma visão de Estado mínimo.

“Temos a missão de impedir que este governo golpista acabe com a Previdência e a transforme apenas em uma questão de receita para beneficiar o capital. Vimos o que representa esse direito, quando foi atrelado ao ministério da Previdência, algo que nem a ditadura fez. Não é possível ficar até 65 anos trabalhando na agricultura ou na boca de um forno. Não podemos comparar trabalhador em péssimas condições com outro fica em um escritório. Essa é a maior injustiça que esse governo colocando nos ombros da classe trabalhadora neste país”, disse.

Desmanche

Na avaliação do supervisor técnico do escritório do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Victor Pagnani, a PEC 241/55 (Proposta de Emenda à Constituição), que congela os investimentos públicos por 20 anos, mostram como os gastos serão enxugados no governo.

“É um novo regime fiscal do Estado, que congela as despesas primárias, com serviços públicos, mas que não inclui as financeiras, para pagamento de juros e amortização das dívidas. Corta dos pobres que necessitam dos serviços públicos para poder pagar aos bancos, rentistas, aquele 1% dos brasileiros que possuem altas aplicações financeiras.”

O governo parte, afirma, de um diagnóstico de que as despesas crescem de forma descontrolada, mas ignora que o financiamento da Seguridade ocorre de maneira tripartite. “Isso é uma falácia porque só considera as contribuições feitas por empresas e trabalhadores e não as contribuições feitas pelo governo. Impostos são recolhidos para financiar a Seguridade Social, é um direito do cidadão em um sistema tripartite”, alerta.

Para ele, seria possível um outro modelo de ajuste fiscal, que incluísse a redução da taxa de juros, a volta do crescimento econômico, a reforma tributária com o fim das desonerações e o imposto de renda sobre lucros, dividendos e grandes fortunas.

Com a PEC do congelamento dos gastos aprovado, reformas que atingem os mais pobres, como a mudança na Previdência, seria questão de tempo.

“É cruel igualar a idade de aposentadoria entre homens e mulheres, que tem cuidados com casa e filhos e mais interrupções por conta da maternidade. Assim como acabar com a aposentadoria especial para os rurais, que tem um trabalho degradante. O objetivo é que desistam da Previdência social e migrem para Previdência privada. Pela primeira vez nos últimos 13 anos o mínimo teve ganho abaixo da inflação”, lamentou Pagnani.

Durante o encontro, a Fenapi também aprovou um documento que será entregue em Brasília com reivindicações dos trabalhadores aposentados. Clique aqui para ler.

Lula: crescimento só volta com democracia e eleição direta

A economia só voltará  a crescer com a recuperação da democracia, o que inclui eleições diretas, e com presença forte do Estado, o que exige credibilidade, afirmou  o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Credibilidade você só conquista com um governo eleito pelo povo”, disse Lula a uma plateia de sindicalistas, principalmente do setor metalúrgico, para acrescentar que o atual governo “deu o golpe exatamente para fazer o que vocês não querem”. “Ou a gente recupera a democracia, ou a gente volta a eleger um presidente da República, ou não vamos ver a economia voltar a crescer.”

Ao contar que se reuniu ontem com um grupo de economistas, o ex-presidente disse que é preciso apresentar uma proposta alternativa, considerando o momento instável do país. “Temos de agir com certa anormalidade. Temos autoridade moral e política de apresentar uma proposta alternativa.” Uma proposta “contundente”, disse Lula, mas que também não seja o “tudo ou nada”.

Seja qual for a proposta, o Estado tem de ser central, ressaltou Lula. “O governo tem de ser o motor de arranque. Se não for o Estado, é ninguém. O Itaú não empresa dinheiro a longo prazo, o Bradesco não empresta dinheiro a longo prazo. Quem empresta dinheiro a longo prazo é o Estado, o banco de desenvolvimento. O Estado tem a obrigação de acionar a máquina.”

Ele afirmou ver uma discussão “um pouco invertida” nos jornais sobre seu governo, que teria cometido um equívoco ao sustentar um modelo econômico baseado no consumo. “Quero que alguém me diga qual é o empresário que vai fazer investimento se não tiver consumo? Quem vai plantar batatinha se não tiver consumo de batatinha?”, questionou o ex-presidente, reafirmando que o país precisa “conquistar o direito de ter um presidente legitimamente eleito pelo voto”.

Pito no Meirelles

Para Lula, mesmo com algum aumento da dívida pública, o Estado tem de ajudar a impulsionar a economia por meio do investimento em infraestrutura e do aumento do crédito, em vez de aplicar uma política de cortes, como o atual governo – mas observou que isso exige credibilidade, que vem do respaldo eleitoral. Ele voltou a citar a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, que recentemente, diante do ministro da Fazenda brasileiro, Henrique Meirelles, disse que a prioridade das políticas econômicas deve ser o combate à desigualdade social. “Nossa companheira francesa deu um pito no Meirelles”, ironizou. Na sexta-feita (20), Lula havia dito em evento do PT que o FMI, comparado a Temer, é “esquerda porreta”.

O ex-presidente também observou que houve erros no governo Dilma, como a política de desonerações, muito mais ampla do que em sua gestão. Assim, uma política destinada a manter o nível de emprego e as políticas sociais acabou causando problemas. “A caixa foi ficando vazia. A gente não olhou corretamente”, comentou Lula, que participou de debate promovido pela Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM-CUT).

Ele criticou ainda a Operação Lava Jato, não pelo combate à corrupção. “Não estamos levando a sério o que a chamada Operação Lava Jato está fazendo com a economia brasileira. Segundo várias informações, o efeito chega a 2,5% do PIB.” Vendo interesses estrangeiros em jogo, Lula afirmou que a elite brasileira ainda padece do complexo de vira-lata. “Não estou preocupado com aqueles que devem 300 reais, estou preocupando com aqueles que devem bilhões e não pagam, com o prejuízo à economia com aquela operação (Lava Jato).”

E reafirmou que seu governo conseguiu derrubar alguns tabus. “Era possível aumentar as exportações e o mercado interno. Provamos que era possível trabalhar as duas políticas. Era possível aumentar o salário mínimo e ter aumento real de salário sem aumentar a inflação. Nos meus oito anos de mandato, a inflação ficou dentro da meta estabelecida.”

“É hora de gritar”, disse o ex-presidente, pedindo aos sindicalistas que se preparem. “Não sei se vocês estão fazendo ginástica. Eu corri 10 quilômetros hoje.”

O evento promovido pela CNM-CUT em São Bernardo do Campo continua agora à tarde, com a presença, entre outros, do ex-ministro Carlos Gabas.

Dieese critica reforma da Previdência em nota técnica

O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) divulgou uma nota técnica sobre a PEC 287 que dita as normas para a reforma da Previdência. O texto critica a reforma e afirma que ela reduzirá a “abrangência e a capacidade de proteção social”.

A Nota Técnica 168, elaborada pelo DIEESE, analisa as principais mudanças nas regras previdenciárias e assistenciais propostas pela PEC 287, caso seja aprovada. Entre as alterações estão:

·       A concessão da aposentadoria passa a requerer do segurado pelo menos 65 anos de idade e um mínimo de 25 anos de contribuição mensal. Extinguindo, dessa forma, a aposentadoria por tempo de contribuição e a redução de idade para mulheres, rurais e professores da educação básica. Para homens com 50 anos ou mais e mulheres com 45 ou mais, haverá uma regra de transição, determinada por um pedágio de 50% sobre o tempo de contribuição que falta para completar 35 anos (homens) e 30 anos (mulheres). Dessa forma, haverá um retardamento do momento da aposentadoria para todos;

·       O período de contribuição mínima passa de 180 contribuições (15 anos) para 300 contribuições (25 anos);

·       A nova base de cálculo para o Salário de Benefício será a média de todos os valores de contribuição e não dos 80% maiores valores de contribuição, como é atualmente. O valor do benefício passa a ser equivalente a 51% do salário de benefício mais 1% a cada ano de contribuição. Na regra anterior era 70% do salário de benefício mais 1% por ano de contribuição. Com isso, haverá uma redução do valor do benefício;

·       O valor da aposentadoria por invalidez, que passa a ser denominada de “aposentadoria por incapacidade permanente para o trabalho”, é reduzido de 100% do salário de benefício para 50% mais 1% por ano de contribuição do SB;

·       A idade mínima para aposentadoria será progressiva, ou seja, haverá uma elevação automática do requisito mínimo que seguirá o aumento da expectativa de vida dos brasileiros aos 65 anos;

·       No caso de pensão por morte, a PEC mantém as regras de acesso, mas muda os valores dos benefícios, a começar pela desvinculação do salário mínimo, permitindo que o valor do benefício seja inferior a esse piso;

 

O Dieese também observa que desde setembro de 2015 as centrais sindicais vêm negociando com representantes do governo questões referentes à Previdência Social. Em junho de 2016, centrais sindicais apresentaram ao governo atual um documento com propostas para melhoria da gestão e do financiamento da Previdência e reafirmaram o princípio constitucional de que a Previdência compõe a Seguridade Social, que, por sua vez, tem resultados financeiros positivos, dada sua base ampla e diversificada de financiamento. 

Morte de ministro causa perplexidade e dúvidas sobre substituto na Lava Jato

Após a confirmação da morte do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), Brasília vive, juntamente com o choque da notícia, a busca por três informações, tidas como importantes e necessárias. Primeiro, detalhes sobre os procedimentos de substituição de Zavascki na relatoria dos processos da Operação Lava Jato no STF. Depois, pedidos de investigação sobre a queda da aeronave que o vitimou e em que circunstâncias. E, por fim, o comunicado oficial do tribunal sobre os locais de velório e sepultamento do magistrado.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Roberto Carvalho Veloso, foi um dos mais contundentes a se pronunciar sobre a morte de Teori. Ele afirmou, em nota, que os magistrados federais estão todos consternados. “Perdemos um magistrado sério, honesto e cumpridor dos seus deveres. Diante da alta responsabilidade dos processos que ele conduzia, é imprescindível a investigação das circunstâncias que resultaram na queda do avião”, destacou.

Da mesma forma, o delegado Marcio Anselmo, responsável por várias das investigações da Lava Jato, afirmou em uma rede social que está perplexo e que “um acidente aéreo às vésperas da homologação da delação premiada da construtora Odebrecht deve ser investigado profundamente”.

Informações extraoficiais no STF (ainda não confirmadas pela família, nem pelo tribunal) são de que o corpo do ministro virá primeiro a Brasília e será velado no Supremo. Em seguida, seguirá para Santa Catarina, onde será sepultado.

Já a dúvida que diz respeito à substituição do ministro na relatoria da Lava Jato continua sendo objeto de opiniões diversas. Magistrados e operadores do Direito destacaram que há duas possibilidades. No caso de morte de um ministro, caberá ao presidente da República indicar um novo nome para substituí-lo e, neste caso, o seu sucessor deverá, segundo estabelece o regimento interno da corte, assumir todos os processos que estavam sob a relatoria do antecessor.

Por outro lado, existe a possibilidade de a presidenta do STF, ministra Cármen Lúcia, ter a prerrogativa de decidir de imediato um outro ministro para a relatoria dos processos da Lava Jato, antes mesmo de ser escolhido o substituto de Teori, levando-se em conta a relevância deste trabalho. Precedente neste sentido, segundo confirmou o ministro Marco Aurélio Mello, já foi observado tempos atrás no tribunal.

Também já se pronunciaram sobre o falecimento do ministro o juiz federal Sérgio Moro e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Moro afirmou que o ministro foi “um grande magistrado e um herói brasileiro”. “Ele foi exemplo para todos os juízes, promotores e advogados. Espero que o seu legado de seriedade e firmeza na aplicação da lei não sejam esquecidos”, acrescentou. Janot divulgou nota ressaltando que Zavascki “honrou o papel de magistrado ao atuar de forma ética, isenta e extremamente técnica em toda a sua carreira”.  

Esta semana, o ministro Teori Zavascki confirmou que estava trabalhando no período de recesso para adiantar os trabalhos sob sua alçada. O magistrado tinha interrompido as férias para analisar a delação premiada de 77 executivos da Odebrecht e já estava determinado o início das audiências com os depoentes para a próxima semana.

Confirmação

A certeza de que o ministro Teori Zavascki faleceu no acidente com um avião que caiu por volta das 14h na chegada a Paraty foi divulgada pouco antes das 18h. A informação do Corpo de Bombeiros é de que quatro pessoas estavam na aeronave. Destas, três estão mortas e uma continua desaparecida. Foi o filho do magistrado, Francisco Zavascki, quem confirmou que a família tinha acabado de receber a informação do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro.

Desde que foi divulgada a notícia da queda da aeronave, a capital do país passou a viver um ambiente de nervosismo e turbulência na área próxima à sede do STF e seus edifícios anexos. A mesma movimentação nervosa também foi observada nos corredores do Congresso Nacional e demais órgãos dos três poderes.

Dentro do STF, o clima foi de choro, correria dos servidores de um gabinete para outro, e poucas informações divulgadas, assim como muita procura por notícias. O ambiente também foi semelhante na sede do Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde Zavascki foi ministro de 2003 até 2012 – quando deixou o cargo para assumir vaga no Supremo, e é muito querido, tanto entre os servidores como junto aos colegas magistrados.

Cármen Lúcia, que tinha acabado de chegar a Belo Horizonte quando soube do acidente, entrou em contato de imediato com  o presidente Michel Temer para pedir que fossem colocadas à disposição da operação de resgate equipes da Marinha e mais grupos do corpo de bombeiros. A ministra, assim como vários magistrados do STF, já está se deslocando de volta a Brasília.

O avião que conduzia o ministro saiu de São Paulo e era do modelo Beechcraft C90GT, prefixo PR-SOM.  A aeronave está registrada em nome da empresa Emiliano Empreendimentos e Participações Hoteleiras Limitada. Informações da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) são de que toda a documentação da aeronave encontra-se em situação regular.

Ainda não há divulgação sobre a causa do acidente. A queda aconteceu no mar de Paraty, próximo da chamada Ilha Rasa, localizada a cerca de dois quilômetros do litoral.

De estilo discreto, avesso a entrevistas, embora cordial com os jornalistas, Teori Zavascki era considerado um dos ministros mais dedicados aos trabalhos do tribunal. Ele sempre se destacou como julgador por sua predileção por temas relacionados a Direito Tributário, mas quando foi escolhido para a relatoria dos processos da Lava Jato empenhou-se ao trabalho com igual afinco.

Depois que ficou viúvo, em 2013, o ministro passou a se voltar ainda mais para o trabalho. E não foram poucas as vezes em que os jornalistas se amontoaram em frente ao prédio do STF, em domingos e feriados, diante da constatação de que Teori e sua equipe estavam reunidos no gabinete, para adiantar relatórios e processos.

PEC da Previdência reduz proteção e torna aposentadoria integral uma “utopia”

O Dieese considera a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287 “um passo a mais na corrosão da confiança no sistema da Previdência pública e, portanto, coloca em risco a Previdência Social e toda a estrutura de proteção social construída a partir da Constituição de 1988”. Segundo afirma a instituição, em nota técnica, a PEC apresentada pelo governo Temer em 5 de dezembro contraria políticas que buscam reduzir as desigualdades e torna a aposentadoria integral praticamente uma “utopia”, retardando em uma década esse direito do trabalhador que contribuiu para o sistema.

Em síntese, diz o Dieese, a proposta visa a dificultar ou impedir acesso a benefícios – para quem conseguir, retardar o início do recebimento e reduzir o valor. Por isso, o instituto afirma que o governo promove uma “minimização” da Previdência pública.

“A fragilização da Previdência Social se articula com o enfraquecimento das políticas públicas voltadas para a população e favorece o aumento da vulnerabilidade social, da pobreza e das desigualdades no país, contrariando o artigo 3º da Constituição que declara, como parte dos objetivos fundamentais da República, a construção de uma sociedade justa, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais”, diz o Dieese, que vê negligência do Estado em sua função de proteção social, além de sinais de favorecimento ao setor privado. “Transparece ainda na proposta um objetivo implícito de fragilizar a Previdência Social e estimular a difusão de sistemas privados de previdência.”

Além disso, obter a aposentadoria integral passaria a ser uma “utopia” caso a proposta seja aprovada. “Caso a trabalhadora ou o trabalhador consiga se aposentar pelos limites mínimos de idade e de tempo de contribuição, o valor do benefício será de 76% da média calculada com base em toda sua vida contributiva desde julho de 1994”, lembra o Dieese. “Para garantir o valor integral do benefício, a pessoa trabalhadora teria que contribuir por 49 anos, tempo que demonstra a utopia que será o desejo de se aposentar com valor integral, mesmo que calculado com base em toda a trajetória contributiva.”

Pela análise do Dieese, a PEC 287, ao considerar políticas públicas apenas como despesas, assume uma perspectiva meramente financeira. Para o instituto, um possível “alívio financeiro” para o Estado resulta em ônus para os trabalhadores e as famílias. Isso acontece na medida em que “essas políticas deixam de ser tratadas como garantidoras de direitos sociais, para os quais deve-se, sim, discutir regras, mas também buscar garantir financiamento”.

Pior que o fator

Na nota técnica, o instituto também critica mudança de cálculo de benefícios, reduzindo o patamar inicial do valor da aposentadoria como percentual do salário de benefício de 70% para 51%. “A forma de cálculo do benefício indica redução imediata da taxa de reposição, ou seja, da relação entre o valor do benefício e o salário de contribuição. Isso decorre da redução do percentual mínimo garantido de 70% para 51% e do fim do fator previdenciário e da fórmula 85/95, bem como da mudança da média dos 80% maiores valores do salário de contribuição para a média de todos os valores. Pode-se dizer ainda que a forma de cálculo da PEC é pior do que a regra atual do fator previdenciário, pois ela exige tempo de contribuição muito maior para resultar em aposentadoria de 100% do salário de benefício”, compara.

Sobre a regra geral para aposentadoria, a partir dos 65 anos e com pelo menos 25 anos de contribuição, o Dieese afirma que a PEC “retarda em uma década o momento em que o trabalhador pode se aposentar com 100% do valor do salário de benefício para o qual contribuiu durante a vida laboral”. Com a regra proposta, o valor mínimo do benefício seria de 76% da média das contribuição, considerando 76% a soma de 51% (percentual mínimo) e 25% (anos de contribuição). 

Para alcançar 100% da média, lembra o Dieese, seria necessário contribuir durante 49 anos. Ao destacar, citando dados da própria Previdência que em 2014, em média, cada trabalhador pagou 9,1 contribuições previdenciárias, “com essa taxa de 9,1 contribuições por 12 meses, seria necessário esperar 64,6 anos, depois de iniciar a vida laboral, para completar o correspondente a 49 anos de contribuições”.

Ao analisar a proposta de aumento do tempo mínimo de contribuição, de 15 para 25 anos, o instituto fala em “forte enrijecimento da regra” de acesso ao benefícios. “Acumular 300 contribuições mensais não é trivial no mercado de trabalho brasileiro, em função da rotatividade, da informalidade e ilegalidade nas contratações, dos períodos em desemprego e das frequentes transições entre atividade e inatividade econômica”, observam os técnicos do Dieese. “Outra evidência de que grande parte dos contribuintes não consegue e não conseguirá contribuir o suficiente para alcançar uma aposentadoria mais vantajosa é o fato de que apenas 49% deles conseguiram fazer as 12 contribuições mensais ao longo de 2014.”

Irrealista

O instituto destaca que a exposição de motivos da PEC não traz explicação sobre a proposta de mudança do cálculo do benefício. “Tudo indica que o raciocínio utilizado foi: subtrair a idade legal de início de trabalho no Brasil (16 anos) da idade mínima de aposentadoria proposta (65 anos) e fazer com que ao resultado dessa diferença (49 anos) corresponda à aposentadoria integral”, analisa. “A suposição, totalmente irrealista para a realidade brasileira, é que a pessoa trabalhadora contribuiu todos os meses, ininterruptamente, no período entre os 16 e os 65 anos, sem nunca ter ficado desempregada, inativa do ponto de vista econômico, na informalidade (isto é, como autônoma sem contribuição previdenciária) ou na ilegalidade (contratada sem carteira). A suposição do início do período contributivo aos 16 anos também desconsidera o princípio de que, nessa idade, a pessoa ainda deveria estar em processo de escolarização e de formação para o trabalho.”

O Dieese lembra que, desde setembro de 2015, as centrais negociam com o governo. Em junho do ano passado, apresentaram um documento com propostas de melhoria da gestão e do financiamento da Previdência, incluindo revisão ou fim de desonerações sobre folha de pagamento, revisão de isenções para entidades filantrópicas, alienação de imóveis, melhoria da fiscalização, cobrança de dívidas e fim da aplicação da Desvinculação de Receitas da União (DRU) sobre o orçamento da Seguridade Social. De todas as medidas, o governo aproveitou apenas uma na PEC: “De fato, a proposta determina que as exportações do agronegócio passem a contribuir para a Previdência e também que, para muitas empresas, deixe de ser vantajoso optar pela tributação sobre o faturamento em substituição à contribuição sobre a folha de salários para a Previdência”. Mas acrescenta que, apesar da motivação “fiscal” para a reforma, “o governo não lançou qualquer medida que reduza a profunda injustiça tributária que existe no país”.

A PEC 287 aguarda a formação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados.

“São Paulo teve ganhos civilizatórios e a casa está em ordem”

Ao deixar o comando da maior cidade do continente e, segundo ele, a casa em ordem em um tempo de estados e municípios falidos, Fernando Haddad revela uma ponta de tristeza por não conseguir se reeleger. Para se completar um ciclo baseado num conceito humanizado de gestão, oito anos estariam de bom tamanho. “Em 2020, não estaríamos discutindo velocidade nas vias ou De Braços Abertos, seriam programas já consolidados”, acredita. Mas ele próprio entende que as vitórias da esquerda na capital paulista “são pontos fora da curva”.

 
Haddad lembra que mesmo governos com aprovação de até 80%, como os de Luiz Inácio Lula da Silva, seu partido, o PT, perdeu na cidade as eleições presidenciais de 2006, 2010 e 2014. E pondera que o país não vive uma situação normal, depois de um período de mais de 10 anos de intenso ataque dirigido a demonizar a política, como um todo, e a esquerda, em particular. “O que acontece aqui não é disputa, virou carnificina em torno de ideologia.”
 
Apesar de sucedido por um conservador, que vê a cidade como negócio, o agora ex-prefeito duvida que programas que caíram nas graças da população sejam desmontados, por constar de um planejamento de longo prazo, até 2030, “muito bem amarrado”. O Plano Diretor Estratégico, que rendeu à administração reconhecimento internacional e prêmios urbanísticos, pode ser ajustado, mas não desmontado, acredita. A disputa será mais no plano do simbólico do que conceitual, aposta Haddad, agora prestes a retomar carreira de professor de Ciência Política na Universidade de São Paulo. “E na disputa simbólica, acho que o lado republicano vai ganhar”, emenda.
 
O sr. disse algumas vezes que não se preocupava com a reeleição, e que importante é fazer o que tem de ser feito. Mas uma preocupação com a continuidade dos programas não seria uma postura republicana? Faltou preocupação com a política?
 
Olha, procurei alinhavar o desenvolvimento da cidade o quanto eu pude. Eu aprovei a reestruturação da dívida de uma maneira duradoura. São Paulo hoje está na melhor condição financeira dos últimos 20, 25 anos. Isso nem meus adversários contestam. Deixei o planejamento urbano da cidade pensado até 2030, amarrei o desenvolvimento urbano a um plano de longo prazo, que é o Plano Diretor Estratégico. E licitei o maior conjunto de obras da história da cidade. Muitas eu entreguei, outras estão em curso ou vão ser iniciadas, porque estão conveniadas com o governo federal. Do ponto de vista tanto do PDE quanto dos planos setoriais, hospitais, UPAs, UBS, habitação, mobilidade, corredores, eu acho que está bem estruturado. Será difícil descontinuar. Acho que a descontinuidade vai ser mais no plano simbólico que no real.
 
Como no caso da marginal Tietê…
 
O trânsito da cidade se tornou muito mais civilizado, com corredores e faixas de ônibus, ciclovias, calçadas, diminuição de velocidade, transporte individual por aplicativo, carpooling. Organizamos uma série de coisas e está se discutindo a velocidade em duas vias. É mais simbólico do que real. Pega os programas sociais que eu desenvolvi. O único que está em disputa é o De Braços Abertos. Os outros nem se discute. Às vezes se discute a perfumaria para demarcar território no campo simbólico. Mas duvido que o essencial seja desconstruído.
 
Mesmo passando de uma gestão que se propunha a pensar em cidade humanizada para uma que pensa em cidade para os negócios?
 
Isso é grave. Abrir-se mão disso, desse conceito. Se a disputa simbólica se desdobrar em efeitos práticos e as pessoas não se verem mais como o centro da política para cidade, você pode ter um prejuízo civilizacional. Houve um ganho civilizacional importante na cidade de São Paulo. A cultura bombou, os espaços públicos, a apropriação das ruas. A questão da Avenida Paulista é muito simbólica. Você colocar uma ciclovia na principal avenida da América Latina, fechar aos domingos, botar artista de rua, food truck, parklets. Mas vamos ver até aonde vai a coragem para desmontar essas coisas. E vamos ver também até onde vai a disposição da cidade, de setores esclarecidos, em defender isso. A ideia original de desfazer a Paulista Aberta, colocando só meia faixa, durou 15 dias. A reação foi grande e houve um recuo. Se houver essa disputa simbólica, acho que o lado republicano vai ganhar.
 
O Doria já sinalizou, por exemplo, uma revisão do Plano Diretor. E já há um histórico de quando a Marta aprovou Plano Diretor e não houve continuidade nas gestões Serra e Kassab.
 
Eu conhecia as fragilidades e procurei prevenir desta vez. O Plano Diretor está muito bem amarrado. Vai ser pedreira mexer com ele. Foi elogiado pela ONU, teve repercussão internacional. O PDE de São Paulo foi premiado pelo site de urbanismo mais acessado do mundo, o ArchDaily. O representante da ONU participou da sanção e o melhor discurso foi o dele. Ajustar, pode ser, mas desmontar vai ser difícil.
 
Em 2006, 2010 e 2014, mesmo “apanhando” muito da imprensa, Lula e Dilma venceram eleições por terem alcançado resultados perceptíveis na vida das pessoas. Faltaram em sua gestão ações mais “perceptíveis”?
 
Nas três eleições que você citou, perdemos na cidade de São Paulo. Aqui a disputa ideológica é muito maior do que em qualquer outro lugar do país. A imprensa é toda alinhada com o ponto de vista conservador. A Erundina ganhou uma vez, a Marta ganhou e eu ganhei. Mas são pontos fora da curva. Nas três eleições que você menciona, perdemos na cidade. E estamos falando de um presidente que teve mais de 80% de aprovação. Por quê? Vamos sair um pouquinho da capital. Veja o que aconteceu no ABC. O Luiz Marinho não conseguiu fazer o sucessor em São Bernardo. O Carlos Grana, em Santo André, e o Donisete Braga, em Mauá, não foram reeleitos. E não foi por falta de realizações, todos fizeram boas administrações. É um contexto muito complexo.
 
Dificuldades não eram esperadas? O sr. comenta reiteradamente que a imprensa pegou no seu pé.
 
Uma muralha, né? Escondeu realizações e atacou coisas boas. Eu vou te falar uma coisa: quando eu estava na reunião com o papa, em Roma, com prefeitos do mundo inteiro, e disse que a OAB havia entrado com ação contra a redução da velocidade nas vias, as pessoas me perguntaram mais de uma vez se era verdade. A entidade representativa dos advogados está processando a prefeitura por seguir uma orientação da OMS? Eu poderia citar dezenas de casos desse tipo. O que acontece aqui não é disputa, virou carnificina em torno de ideologia. O déficit de republicanismo no Brasil é uma coisa que só não percebe quem não quer. Eu nunca vi uma coisa dessas acontecer. A pessoa chamar ciclista de comunista. Criticar faixa de ônibus. Tudo por ideologia. É uma coisa impensável. Se fosse outro prefeito a fazer, iriam elogiar.
 
Sua gestão não foi condescendente e valorizou os grandes veículos de comunicação? Integrantes da administração deram mais atenção a eles, ofereceram “furos” sobre ações da administração, enquanto houve desatenção aos veículos menores e alternativos.
 
Pode ser. Se você está falando, eu acredito. Vocês talvez tenham sido vítimas desse processo.
 
Tivemos mesmo dificuldades para ser atendidos…
 
Isso pode ter acontecido, mas não por minha vontade.
 
Não é algo que tem de ser repensado? Até o governo Lula é criticado por não ter feito reforma que democratizasse a comunicação.
 
É verdade. Você veja que os grandes veículos entraram com ação para tirar do ar sites do El País, BBC e The Intercept. Olha a que ponto chegamos! Quererem tirar do ar veículos que são mais independentes, menos impregnados de ideologia conservadora. E ninguém discute isso. Não se viu notícia disso. Eu acho até que vi na Rede Brasil Atual, mesmo. Por onde eu saberia? Nem os veículos alvos da ação noticiaram.
 
O sr. evitou ir para o embate com o governador Geraldo Alckmin porque dizia que sempre saía perdendo. Ele tinha uma blindagem a favor e o sr., hostilidade. Não faltou esforço para marcar essas diferenças do que é obrigação do estado e a obrigação da prefeitura?
 
Você já reparou como são as manchetes nos jornais? “Haddad fez tal coisa…” e “DAEE tal outra coisa”. Quem é o DAEE? Ninguém sabe. “Sabesp tal coisa”, “Dersa tal coisa”. Um dia eu vi uma matéria que dizia “engenheiro da gestão Haddad…”, ele era um engenheiro de carreira e a Folha deu que era da minha gestão. Conseguiram colocar meu nome na manchete. Quando pode isso, pode tudo. Teve uma vez um “Irmão de secretário de Haddad é processado”, aí descobriram que ele era irmão de um secretário estadual, e sumiram com a manchete. Era só trocar meu nome pelo do governador.
 
Agora, vozes que se calaram durante as eleições estão dizendo “que absurdo voltar a velocidade original das marginais”. Onde esse pessoal estava há três meses? Viajando? Ficou bonito o que era feio?
 
Independentemente da conduta dos jornais, o sr. não exagerou no republicanismo na relação com o governo estadual? Um exemplo: em junho de 2013, quando o Conselho da Cidade recomendou rever o aumento da tarifa de ônibus, o sr. não acatou, ficou junto com Alckmin.
 
A decisão do recuo foi no dia seguinte à reunião do Conselho. Aquilo comprometeu todo o planejamento que tinha sido feito até março, custou R$ 1,5 bi para a cidade. Eu dizia que aquele movimento não tinha nada a ver com tarifa, e eu estava certo.
 
O Ministério Público foi mais rigoroso com seu governo?
 
O MP, enquanto instituição, teve um relacionamento importante conosco, principalmente no combate à corrupção. Foram parceiros de primeira hora no combate, onde se descobriram as várias máfias dentro da prefeitura. Um ou outro promotor tem essa postura menos republicana, mas não é a instituição. Tivemos um problema com um promotor Marcelo Milani, que vem perdendo as ações que propôs sem pé nem cabeça. Isso causa um problema para a gestão. A imprensa não separa o MP como instituição da ação de um promotor especificamente. Esse é um promotor que tem uma atitude não republicana, por isso entramos com duas representações contra ele na corregedoria do MP, uma foi acatada.
 
O sr. se relaciona com as páginas de seus “clones” das redes sociais, como Prefeito Gato ou o Haddad Tranquilão? Eles dizem coisas que gostaria de dizer e não pode?
 
Eu tenho identidade com o bom humor e eles são bem-humorados, mesmo sendo críticos às vezes. Isso compõe parte da minha personalidade. Eu sempre procuro manter o humor e a autoironia, então eles captam um traço da minha personalidade.
 
Tem também o Prefeito Gourmet, mais crítico, abordando que o sr. fez uma gestão voltada para classe média e deixou a periferia de lado.
 
É desconhecimento. Onde eu construí hospital, CEU, creche, corredor de ônibus, LEDs, Uniceu e praça com Wi-Fi? Se fosse listar aqui, é tudo na periferia. “Às vezes a pessoa acha que conhece São Paulo e repete o que o (comentarista Marco Antonio) Villa diz na Jovem Pan. Eu tenho pena de quem repete o Villa. Isso traz muitas consequências como estamos vendo agora, muita intolerância e ódio. Além de muita demonização da política. Quem são os intelectuais orgânicos desse projeto conservador que está em curso? Comentaristas de rádio, subintelectuais, pessoas despreparadas. A assimilação por parte da elite econômica de um pensamento tão raso dá conta do pé em que nós estamos.
 
Esse não é um fenômeno da “redessocialização” da política? O que importa não é a proposta, é “mitar”? A última campanha, por exemplo, pouco discutiu projetos.
 
É uma pena para a cidade uma imprensa ter comprado isso. A imprensa não forçou a discussão sobre “kit gay”? Assimilou até o bordão da extrema-direita para tratar de um assunto sério. A partir daí você tira a base do rebaixamento do debate político. Chamar de “bolsa crack”, “bolsa travesti”, “kit gay”, onde nós estamos? Estamos discutindo programas reconhecidos internacionalmente.
 
Pode haver uma evasão da população que está sendo atendida pelos De Braços Abertos com a proposta do Doria de cortar o auxílio?
 
Não consigo entender o argumento de que um drogado rico pode receber salário e um pobre, não, porque ele compra droga. Não tem jornalista que consome droga? Não tem político que consome droga? Eles não recebem salário no final do mês? Por que alguém que cuida da zeladoria da cidade não pode receber salário? E estamos falando de R$ 15 por dia. Eu não consigo entender o drama, porque não é uma “bolsa”. É remuneração por trabalho. Falam “não pode dar dinheiro para drogado”, olha esse jeito de tratar a população, nunca foram conversar com eles. A primeira atitude que você deve fazer é avaliar o programa com os beneficiários, falar com os médicos que atendem essa população.
 
Algumas pessoas se dizem mais tristes com a sua derrota do que com o impeachment, por verem na sua administração um projeto de cidade inclusiva. O sr. também sente tristeza por ter perdido, ou já estava preparado?
 
Eu sabia dos riscos, quem viveu 2013 e 2016 não poderia estar otimista. Foi o período mais turbulento que eu vivi, já são quase 54 anos. Mas eu queria ficar mais quatro anos e concluir um ciclo. Em uma cidade pequena, talvez, em quatro anos você consegue mostrar a que veio. No Ministério da Educação, por exemplo, se eu tivesse ficado só quatro anos (ficou de 2003 a 2012, sendo a partir de 2005 como ministro) não teria deixado o legado que deixei, que hoje já está documentado, tem livro sobre o assunto. Em São Paulo, precisaríamos de oito anos para completar o ciclo. Garanto que não íamos mais discutir velocidades das marginais em 2020, nem radar, nem Braços Abertos. Nada disso. Tudo isso estaria consolidado e assimilado.