CUT e movimentos sociais farão novo ato contra pauta de retrocessos

Diante de articulações feitas por deputados e senadores da base aliada, a CUT, o Comitê Nacional de Defesa das Empresas Públicas e representantes de movimentos sociais pretendem fazer da próxima quarta-feira (5), em todo o país, um dia de mobilizações contra o que chamam de “desmonte do Estado”. A preocupação se concentra em dois textos, cuja tramitação o governo Temer pretende agilizar: o Projeto de Lei (PL) 4.567 – que flexibiliza a participação da Petrobras nos contratos do pré-sal – e a roposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita os gastos públicos por 20 anos.

O objetivo é protestar contra as articulações do governo, explicar o perigo da aprovação dessas propostas para a população e ajudar a conscientizar os parlamentares sobre o desgaste de estarem se posicionando por matérias legislativas que, além de impopulares, representarão retrocessos para o Brasil. Esses movimentos e parlamentares de partidos como PT, PCdoB, Rede e Psol também querem aproveitar para fazer questionamentos e combater a reforma do ensino médio, anunciada recentemente.

Uma das principais preocupações dos organizadores do movimento diz respeito à PEC 241, que conforme carta divulgada ontem (28) pela CUT, “promoverá um desmantelamento geral do Estado Brasileiro, sufocando as políticas e os investimentos públicos”. Segundo economistas, acadêmicos e analistas diversos, a proposta repreentará “o sucateamento da previdência, da educação e da saúde pública”, caso venha  a se transformar em emenda constitucional.

Posição semelhante também tem o deputado Patrus Ananias (PT-MG), representante do PT na comissão especial que analisa a proposta e que apoia a mobilização dos trabalhadores. De acordo com o deputado, a PEC representa “um visível vício de inconstitucionalidade”. Segundo ele, o texto fere expressamente o inciso 4º do artigo 60 da Constituição, que trata de emendas à Carta.

“Na medida em que a PEC fere, diretamente, direitos e garantias individuais relacionados com a educação, com a saúde, com a assistência social e outras políticas públicas sociais, fere direitos e garantias fundamentais garantidos pela Carta Magna. E nós sabemos também que renomados estudiosos constitucionalistas têm afirmado a unidade indissociável dos direitos fundamentais, onde se integram, se articulam e se complementam os direitos individuais e os direitos sociais”, disse o parlamentar.

Prioridade de votação

A votação da PEC na comissão especial responsável pelo parecer ao projeto está marcada para a próxima terça-feira (4). Caso seja aprovado no mesmo dia na comissão, líderes da base do governo trabalham para que o texto seja enviado com celeridade para os plenários da Câmara e do Senado – motivo pelo qual é importante que a mobilização aconteça na próxima semana.

Já o PL 4.567 está previsto para ser votado na segunda-feira (3), no plenário da Câmara. Caso haja quórum suficiente para abertura da ordem do dia – uma vez que os parlamentares só costumam chegar a Brasília na manhã da terça-feira –, a matéria entrará como pauta única, para forçar a votação, conforme foi acertado entre os líderes na noite de ontem, durante jantar no Palácio da Alvorada com Michel Temer.

Por causa disso, CUT, movimentos sociais e entidades da sociedade civil estão programando um ato público no Congresso. “Os trabalhadores e trabalhadoras brasileiros não permitirão que um governo ilegítimo destrua o arcabouço de proteção social consagrado na Constituição de 1988. Vamos impor aos golpistas um recuo no ataque aos nossos direitos”, afirma a central, em nota.

“Temos que nos unir e reagir aos retrocessos que o governo golpista quer impor aos trabalhadores. A aprovação da PEC 241 traria consequências desastrosas para toda a sociedade, não só nesse momento mas também para as próximas gerações”, destacou a coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, Maria Rita Serrano.

Congelamento de gastos públicos levará a perda de R$ 654 bi para o SUS, diz deputado

Integrante da comissão especial da Câmara que analisa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que congela os gastos públicos por um período de 20 anos, o deputado Patrus Ananias (PT-MG) – ex-ministro dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff – divulgou hoje (29) estimativas do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde segundo as quais o Sistema Único de Saúde (SUS) perderá R$ 654 bilhões em 20 anos, se a PEC vigorar. O que, segundo ele, trará consequências gravíssimas para a população.

No total, de acordo com a avaliação feita pelos técnicos do conselho, este déficit de recursos representará 500 milhões de procedimentos de atenção básica, 83,5 milhões de procedimentos de ambulatórios e 19,6 milhões de procedimentos em hospitais que deixarão de ser oferecidos para os brasileiros.

Conforme explicou Patrus Ananias, o mesmo conselho nacional, ao lado da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação e o Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social, prevê para os próximos nove anos, perdas acumuladas de R$ 345 bilhões nos três setores.

“Também o Dieese afirma que toda a população será penalizada com a muito provável redução, em quantidade e qualidade, dos serviços públicos de saúde e educação”, destacou o deputado.

Patrus divulgou, ainda, informações referentes a estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de autoria dos pesquisadores Fabíola Sulpino Vieira e Rodrigo Pucci de Sá Benevides, prevendo que a PEC 241 “impactará negativamente o financiamento e a garantia do direito à saúde”. “Esse último estudo afirma que o SUS terá menos recursos por pessoa para fazer frente à necessidade de ações e serviços de saúde, o que prejudicará, principalmente, as populações pobres”, disse o deputado.

Para o parlamentar, ex-ministro das pastas de Desenvolvimento Social e de Desenvolvimento Agrário, também na assistência social, os impactos provocados pela vigência da PEC 241 serão “devastadores”.

Segundo ele, no próprio Ipea, outro estudo alerta que a assistência aos pobres perderá nada menos do que R$ 868 bilhões em 20 anos, se a PEC for aprovada. “Estudo assinado por Andrea Barreto de Paiva, Ana Cleusa Serra Mesquita, Luciana Jaccoud e Luana Passos destaca que já em 2017 os recursos da assistência social serão reduzidos em R$ 6 bilhões”, explicou.

Comprometimento de avanços

Patrus Ananias contou que ao analisar as implicações do novo regime fiscal para a política de assistência social, as pesquisadoras do Ipea estimaram que a perda de recursos “comprometerá os avanços já conquistados no combate à pobreza e à desigualdade”. E prevê que programas como o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Sistema Único de Assistência Social serão prejudicados. “A partir de 2026, o congelamento de gastos proposto pela 241 fará que todos os recursos do Ministério do Desenvolvimento Social sejam insuficientes até para pagar o BPC”, ressaltou o parlamentar, que reuniu todos estes estudos.

“Os interesses antipopulares e antinacionais, que estão na origem e nos fins do governo de Michel Temer, têm inspirado uma sucessão de notícias assombrosas à maioria do povo brasileiro e ao Brasil, mas quase sempre expostas em ações trapaceiras, como as de propaganda enganosa. A PEC 241 consiste em mais um desses casos”, alertou.

“Ilusionistas e porta-vozes do ilusionismo oficial dizem que os recursos para as duas áreas serão aumentados, mas ninguém se deixe enganar: é trapaça, é golpe. E querem consumá-lo depressa, com votações a partir da próxima semana”, acrescentou.

5 de outubro é Dia Nacional de Luta contra o Desmonte do Estado Brasileiro

No dia 26 de setembro, a Direção Executiva Nacional da CUT reuniu-se em São Paulo com representantes das Estaduais da CUT e dos Ramos para avaliar os resultados do “Dia Nacional de Paralisações e Mobilizações”, organizado no dia 22 pela CUT e pelas demais Centrais Sindicais em defesa dos direitos sociais e trabalhistas ameaçados pelo governo golpista de Michel Temer, em defesa da soberania nacional, contra as privatizações e a entrega do Pré-sal às multinacionais.

A CUT resistiu ao golpe organizando, com a Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo, inúmeras manifestações de massa contra a ação das forças golpistas e seu projeto de restauração neoliberal. Ao mesmo tempo, a CUT iniciou o processo de construção da greve geral, mobilizando suas bases em torno da consigna: NENHUM DIREITO A MENOS!

Em torno desta bandeira, cerramos fileiras, unindo trabalhadores/as do campo e da cidade, do setor público e do setor privado, e não recuaremos. O que está em jogo não são apenas os direitos conquistados ao longo de décadas de luta, mas o destino do País e o futuro da classe trabalhadora.

Na preparação da Greve Geral, definimos uma estratégia de acumulação progressiva de forças que teve como primeiro marco o dia 22 de setembro. Greves, paralisações parciais, passeatas, panfletagens, debates e outras atividades ocorreram em todo o Brasil, demonstrando a vontade de luta da classe trabalhadora e “esquentando os motores” para a deflagração da greve que deve paralisar o País.

O sucesso da Greve Geral depende ainda de um trabalho mais intensivo dos ramos orientando seus sindicatos a realizarem Assembléias com os trabalhadores para votar a adesão à mobilização. Há motivos de sobra para a indignação dos/as trabalhadores/as nas medidas anunciadas pelo governo golpista – como a reforma da Previdência, a retirada de direitos ( terceirização irrestrita, prevalência do negociado sobre o legislado, flexibilização do contrato de trabalho), a  reforma regressiva do Estado prevista na PEC 241 e no PL 257, além da recente  MP da “reforma do Ensino Médio”.  No entanto, é necessário que essas medidas sejam abordadas nas Assembleias, esclarecendo-se como elas atingirão a classe trabalhadora e a sociedade como um todo.

Neste sentido, a reunião reafirmou as orientações emanadas da reunião da Executiva Nacional da CUT realizada em Brasília em 14 de setembro de buscar a unidade de ação com as demais centrais sindicais na construção da Greve Geral em torno dos pontos citados acima, preservando sua autonomia na explicação da origem desses ataques (o governo golpista de Temer) e na agitação das palavras de ordem que decorrem de sua análise da situação política do país: “Nenhum direito a menos, Rumo à Greve Geral, Fora Temer, Diretas já com Constituinte com assembléia constituinte para a Reforma Política”.

No processo de acumulação de forças em preparação da Greve Geral, duas mobilizações se destacam: o Dia Nacional de Paralisação dos Metalúrgicos em defesa dos empregos e direitos em 29 de setembro; o Dia Nacional de Luta contra o Desmonte do Estado Brasileiro (contra a PEC 241) em 5 de outubro, com concentração de manifestantes em Brasília.

 

 “NENHUM DIREITO A MENOS”;

“Rumo à Greve Geral”

“Fora Temer”

“Diretas Já, com assembléia constituinte para a reforma política”.

 

Bancários mantém greve há 23 dias

A greve dos bancários chega ao seu 23º dia com 13.449 agências e 36 centros administrativos paralisados. A Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) se reúne hoje (28) com o Comando Nacional dos Bancários para retomar as negociações da campanha salarial da categoria.

Na última terça-feira (27), a federação patronal e o comando da categoria se reuniu para uma rodada de negociação em que os patrões apresentaram a proposta de um novo modelo de acordo, com validade de dois anos. Os bancários afirmam que a proposta dos patrões deve contemplar as reivindicações de emprego, piso, vale, creche, igualdade de oportunidades e segurança.

Lula, intelectuais e lideranças apontam eleição de Haddad como ‘estratégia anti Temer’

Em evento realizado na noite de ontem (27) na Casa de Portugal, centro de São Paulo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outras lideranças destacaram a necessidade de levar a candidatura do prefeito Fernando Haddad ao segundo turno e à reeleição pela força política da cidade no enfrentamento ao governo de Michel Temer e à ameaça a direitos e conquistas sociais no país. “Precisamos ter um prefeito sério e responsável governando a cidade mais importante da América Latina para fazer frente aos pacotes do Temer para tirar dinheiro da educação e saúde”, disse Lula.

Haddad afirmou que a eleição deste ano tem importância crucial para a cidade decidir entre o passado e o futuro. “O que está em jogo é se a gente continua rompendo um paradigma que vigorou (em São Paulo) desde o pós-guerra, ou se vamos retomar o projeto velho que sepultamos em 2012. Eu não estou a fim de abrir mão desse sonho”, disse o prefeito.

Segundo Haddad, os eleitores vão decidir se querem a privatização da cidade ou continuar a transformação iniciada em sua gestão. “São Paulo pode liderar uma transformação.” Ele citou, entre outros, o programa “De Braços Abertos” como exemplo de projeto que humanizou a cidade, ao resgatar “pessoas de uma condição sub-humana”.

O prefeito provocou o tucano João Doria. “No segundo turno não vai dar pra dizer ‘eu não sou político, eu sou gestor'”. Doria tem reforçado a ideia de afastar a política da administração pública: “Não sou político, sou empresário”, declarou o candidato do PSDB em entrevistas.

Confiança

O prefeito também se mostrou otimista em relação à disputa. “Em 2012, todos os institutos de pesquisa nos colocaram fora do segundo turno. Até domingo a bola está rolando em campo. Nós vamos pra rua”, conclamou. “Vai ser muito divertido ir para o segundo turno. Porque aí não tem essa de cinco contra um, é tête-à-tête, mano a mano”, disse.

O presidente da CUT, Vagner Freitas, também atacou João Doria. “Tem candidato a prefeito de São Paulo que é inimigo da classe trabalhadora, que persegue a classe trabalhadora. E vai no horário eleitoral dizer que começou a trabalhar com 15 anos de idade, defende os trabalhadores, diz que é o ‘tucano trabalhador’. Quero dizer aqui que esse tucano é vagabundo, inimigo da classe trabalhadora”, disse. Sem citar o nome da ex-prefeita Marta Suplicy, Vagner acrescentou: “Quem vira a casaca, quem muda de lado, é traidor.” Segundo o sindicalista, Haddad “foi respeitoso com os trabalhadores na cidade de São Paulo e teve um dialogo sério e decente” com os trabalhadores.

Lula elogiou o discurso do prefeito: “Vi o Haddad falando com alma e brilho nos olhos, falando com mais emoção do que com a racionalidade com que costuma falar às pessoas. Ele hoje conseguiu se superar.”

Como Lula, vários oradores também destacaram a importância estratégica da eleição em São Paulo. O jurista Pedro Serrano afirmou que Haddad “representa a ideia de cidade, espaço habitado por cidadãos livres, diferentes entre si”. Segundo Serrano, o voto de domingo precisa ser unificado, “contra o fascismo em São Paulo”.

“O significado extrapola ­­em muito a cidade de São Paulo. Lutamos contra o arbítrio e o ataque aos direitos”, disse a vice-prefeita Nádia Campeão (PCdoB).

O escritor Fernando Morais afirmou que as eleições em São Paulo e Rio de Janeiro são estratégicas. “Estamos correndo o risco de entregar as duas maiores cidades do país aos golpistas. Está na hora do PT e do Psol se entenderem, para não entregarmos as duas cidades para a direita.”

O economista Luiz Carlos Bresser-Pereira disse que a capital paulista tem hoje “um grande prefeito”. Ele citou o Plano Diretor e a Lei de Zoneamento como exemplos de que Haddad fez uma reforma pela qual a cidade deve se desenvolver. “Ele deu preferência para o povo, e não aos ricos, e isso eles não perdoam. Estou aqui também para apresentar solidariedade ao presidente Lula, que está sendo perseguido”, declarou Bresser.

Os apoios de alguns intelectuais a Haddad foram transmitidos em mensagens em vídeo. Chico Buarque afirmou: “minha porção de sangue paulistano está com Haddad e não abre”.

O cientista político Singer declarou que “ficar ao lado de Haddad é ficar ao lado da democracia”. O economista Luiz Gonzaga Belluzzo afirmou que a gestão do atual prefeito criou um “ambiente de convivência civilizada”.

Pochmann: “Associo terceirização ao processo de uberização do trabalho”

A universalização da terceirização, seja a aprovada pelos deputados e em tramitação no Senado, seja a da proposta em análise no Supremo Tribunal Federal, é a Uberização da força de trabalho, chama a atenção Marcio Pochmann, presidente licenciado da Fundação Perseu Abramo e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Faz parte do projeto da nova elite agroexportadora, que mantém a desigualdade, em contraposição às propostas fragmentadas da parcela da sociedade que gravita em torno dos serviços e está nas ruas, explica o economista da Unicamp na entrevista a seguir.

Como a terceirização cresceu?

No fim dos anos 1980, início dos 1990, da recessão do governo Collor e da abertura comercial, expuseram o parque produtivo brasileiro à competição internacional sem condições adequadas. Isso culminou em uma reação dos empresários para reduzir custos. A terceirização permitia às empresas concentrar-se nas atividades finalísticas e repassar as atividades-meio, fugindo do modelo fordista em que a empresa fazia tudo. Esse era o discurso que veio de fora.

A terceirização, segundo as empresas, aumenta a produtividade.

A terceirização aumentou muito com a desregulamentação dos anos 1990, do governo Fernando Henrique basicamente como mecanismo de redução de custos e precarização do trabalho. Nesse período, o País não teve ganhos de produtividade. A partir do ano 2000, com o ambiente econômico mais favorável, houve uma ampliação do setor produtivo, com empregos não terceirizados entramos em um ambiente de quase pleno emprego nos melhores momentos.

A recessão estimula a terceirização.

Ela voltou a ganhar espaço no ambiente recessivo, de forte pressão sobre os custos das empresas. O projeto aprovado na Câmara e agora à disposição dos senadores é o inverso do defendido por juristas, especialistas, trabalhadores e sindicatos, de regular a atividade terceirizada de modo a comprometê-la com o ganho da produtividade em vez da redução de custos. A legislação em tramitação não é para os terceirizados, é para universalizar os não terceirizados.

Como vê essa perspectiva?

Associo a universalização da terceirização ao processo de uberização da força de trabalho no Brasil. A ideia do serviço de táxi desregulamentado do Uber é inviabilizar impostos e tributos. O governo está preocupado com fundos públicos para financiar a Previdência, mas a terceirização certamente vai implicar menos arrecadação para o Estado. É coerente com a proposta de relação direta entre patrão e empregado. Descarta-se o sindicato, não há regulação. É uma volta ao século 19.

Quais seriam as perspectivas?

Vivemos uma fase de reavaliação do projeto de redemocratização do Brasil dos anos 1980. Acreditávamos que a democracia poderia ser uma possibilidade de mudança, mas ela não permite isso, toda conquista vai por água abaixo. De 1981 a 2016 a economia brasileira cresceu 2% ao ano em média. Isso dá 0,6% per capita. Estamos num ciclo de decadência da industrialização, que começou nos anos 1980. Hoje a indústria representa 7% do PIB. É uma fase longa de decadência econômica, mas também política, dos valores culturais, dos relacionamentos, das instituições, algo muito maior. Olhamos o curto prazo, o cotidiano, mas há um movimento maior nisso.

 

(Publicado originalmente na edição 919 de CartaCapital)

Limitar FGTS é tentativa de acabar com o Minha Casa, Minha Vida, dizem movimentos

A medida que proíbe a aplicação de recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) no financiamento de obras do Programa Minha Casa, Minha Vida foi recebida, pelos movimentos sociais, como uma nova investida do governo Michel Temer para liquidar o programa. Para o coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, “é uma tentativa de arrochar o programa, criando pretextos para barrar projetos e um controle político do Ministério das Cidades para liberá-los”.

A Instrução Normativa (IN) 24, assinada pelo ministro das Cidades, Bruno Araújo, na última sexta-feira (23), foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) de hoje (26). O documento “desautoriza” a Caixa Econômica Federal a aplicar recursos do FGTS no programa, “enquanto não constar do orçamento fiscal e da seguridade social rubrica específica correspondente à contabilização dos adiantamentos concedidos a partir de disponibilidades dos referidos fundos”. Não se trata da utilização do FGTS pessoal para comprar uma casa, mas do investimento de parte do fundo total no financiamento das obras.

Ainda de acordo com a IN, será da Secretaria Executiva do Ministério das Cidades a decisão sobre a “conveniência e a oportunidade” de garantir a rubrica orçamentária necessária ou a efetivar a contratação de operação de crédito para garantir empreendimentos do Minha Casa, Minha Vida, que utilizem recursos oriundos do FGTS e outras modalidades de financiamento. O ministério alegou cumprir orientações do Tribunal de Contas da União, para evitar que se caracterize empréstimo do banco à União, o que é ilegal.

A medida vai afetar principalmente a faixa 1 do programa, que atende às famílias mais pobres – com renda até R$ 1.800 –, e a modalidade Entidades, cujo projeto e fiscalização da obra ficam a cargo de associações formadas pelos futuros moradores, organizados por movimentos sociais. Ambas contam com amplo subsídio estatal. Nesse caso, até 95% do valor da moradia são bancado pelos governo, com recursos do FGTS e do Tesouro Nacional. O restante é pago pelo beneficiário, em prestações adequadas à renda familiar.

“É um recurso que a Caixa paga às construtoras para viabilizar a obra. Como na faixa 1, a maior parte do recurso vem de subsídio, e não de financiamento bancário, porque as famílias não são sujeitos de crédito, o impacto vai ser maior. Se não tiver FGTS não tem financiamento”, explicou Boulos. As faixas 2 e 3 do programa (famílias com renda mensal de até R$ 3,6 mil e R$ 6,5 mil, respectivamente) podem recorrer a financiamentos bancários e ao uso do FGTS próprio para aquisição de uma unidade habitacional, ação que não é afetada pela norma.

Outra preocupação é que, sendo uma decisão caso a caso do ministério, passem a vigorar critérios políticos na aprovação de projetos. “O governo vai poder definir qual projeto, região ou cidade que vai receber recurso, tirando a autonomia técnica da Caixa para definição dos projetos”, completou. Desde 2009, ano da criação do programa, foram concedidos R$ 39 bilhões em subsídios com apoio do FGTS. Até abril deste ano, foram entregues 2,6 milhões de moradias pelo programa.

Em maio deste ano, Temer determinou a suspensão de todas as novas contratações do programa. Em março, a presidenta Dilma Rousseff havia lançado a terceira fase do programa, com expectativa de construir dois milhões de moradias até 2018. A expectativa atual é construir 500 mil por ano, mas nenhum novo projeto foi aprovado.

O militante sem-teto garantiu que a efetivação dessa medida vai levar a uma reação da população pobre e dos movimentos de moradia, que resultará em ocupações por todo o país. “Não tenha dúvida que isso vai levar a um verdadeiro ciclo de ocupações. Quando a política pública não apresenta nenhuma alternativa, ainda mais com a crise, o desemprego, as pessoas não conseguindo pagar os aluguéis, o resultado vai ser uma explosão de ocupações nas cidades”, alertou Boulos.

O militante Raimundo Bonfim, da Central de Movimentos Populares (CMP), à qual são associados vários movimentos de moradia que atuam na região central de São Paulo e no interior paulista, ressaltou que as famílias de baixa renda da zona rural também serão afetadas pela medida, já que o modelo do programa para essa população é semelhante à faixa 1.

“Vamos nos unir com movimentos do campo para reagir a essas medidas. O governo golpista caminha para o desmonte total do Minha Casa, Minha Vida. Certamente teremos um crescimento das ocupações, tanto na cidade quanto na zona rural”, afirmou Bonfim.

Marcha de milhares em São Paulo é preparativo para greve geral em outubro

Em coro pelo ‘Fora, Temer’, milhares de trabalhadores de diversas categorias e dezenas de sindicatos e centrais sindicais, além de movimentos sociais apoiados pelas frentes Brasil Popular e Povo sem Medo, saíram em marcha pela ruas do centro de São Paulo, no final da tarde de hoje (22), para protestar contra as medidas de arrocho defendidas pelo governo Michel Temer. Os organizadores estimam que cerca de 50 mil pessoas participaram da manifestação. Para o próximo dia 5, as entidades prometem grande marcha em Brasília contra a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que congela investimentos do governo por 20 anos.

 
A mobilização dos trabalhadores em todo o país nesta quinta-feira foi contra a PEC 241, a reforma da Previdência, a terceirização, privatização do pré-sal, congelamento dos investimentos por 20 anos e a reforma do ensino médio (por meio da Medida Provisória 84, anunciada hoje, que altera a Lei 9.394, de 1996).
 
“Inúmeras categorias fizeram assembleias em frente às fábricas, vieram para a capital. Tivemos hoje um termômetro muito claro que os trabalhadores já se atentam para os riscos que todos nós corremos com as propostas de retirada de direitos da classe trabalhadora. Foi um esquenta para a greve geral. São etapas que a gente vai somando, agregando forças com os trabalhadores, para poder garantir que tenhamos um dia de paralisação”, disse o presidente da CUT-SP, Douglas Izzo.
 
“Foi apenas o início da mobilização para organizar a greve geral contra esse governo golpista”, afirmou Douglas. A paralisação está indicada para 28 de outubro, mas a data ainda será avaliada. “A expectativa do governo golpista é aprovar a PEC 241 em outubro. Ao longo do mês, continuaremos em brasília para fazer o enfrentamento no Congresso. Nos estados, também estaremos pressionando os deputados para que votem contra a emenda, que vai ser um retrocesso para a saúde e educação”, disse Douglas.
 
Lideranças
“Desde a manhã de hoje, no Brasil inteiro, a classe trabalhadora parou a produção num espetáculo de mobilização contra a reforma trabalhista e a reforma da Previdência”, destacou o secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre. Para ele, as reformas propostas pelo governo Temer para o mundo do trabalho fazem o Brasil retroceder para os tempos anteriores a Getúlio Vargas (1930-45/1951-54), criando um tipo de empresa sem trabalhadores, apenas com terceirizados.
 
“Querem privatizar o pré-sal, que é o nosso passaporte para melhorar a educação e a saúde. Não há um único trabalhador hoje que não tenha motivo para sair às ruas”, ressalto Nobre. Ele também manifestou solidariedade ao ex-ministro Guido Mantega que, na sua opinião, foi vítima da ação arbitrária de um juiz arbitrário autoritário, ao ser preso pela Polícia Federal no âmbito das investigações da Operação Lava Jato.
 
O presidente da Confederação Sindical Internacional (CSI), João Felício, destacou que ontem (21), em paralelo à Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), houve ato contra o golpe e em solidariedade ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Nova York. “Para o movimento internacional, não é só um ataque contra uma lenda do movimento sindical que ajudou a reconstruir o sindicalismo no Brasil. O golpe é contra a classe trabalhadora.”
 
Segundo Felício, desde o ano passado os sindicalistas internacionais alertavam o mundo que o golpe no Brasil nunca foi porque este ou aquele político estivesse errado, mas, sim, porque estavam acertando. “A elite não gosta do povo pobre, dos trabalhadores, nem dos sindicatos, nem de Lula, nem de Dilma. O que eles querem é aplicar políticas para reduzir o papel do estado, e a esquerda é um empecilho a isso.”
 
“Imagina só um trabalhador começar a trabalhar aos 15 anos e só poder se aposentar aos 65. Isso é uma atrocidade. Imagina 13º e férias terem que ser negociados. Isso é um absurdo. Não aceitaremos as reformas. Se eles acham que vão conseguir impor esse projeto sem resistência dos trabalhadores, vão perder”, afirmou o presidente da CSI.
 
Secretário de Políticas Sociais da CTB, Carlos Rogério Nunes lembrou que tiraram uma presidenta eleita com 54 milhões de votos e colocaram alguém com 61 votos no Senado, com uma agenda que jamais passaria nas urnas. Segundo ele, também estão promovendo uma perseguição ao ex-presidente Lula.
 
João Paulo Rodrigues, coordenador nacional do MST, destacou que o povo está nas ruas não só em São Paulo como em outras cidades. Lembrou que é importante lutar contra o governo golpista, mas principalmente lutar para defender os direitos conquistados. Ele garantiu que o MST vai se somar a todas as lutas, “com as foices afiadas”, para enfrentar Temer e o governo golpista.
 
Coordenador da Frente Brasil Popular em São Paulo e militante da Central de Movimentos Populares (CMP), Raimundo Bonfim ressaltou que são vários os golpes dentro do golpe. “O primeiro foi quando rasgaram a Constituição para tirar a Dilma. Agora, o novo golpe é a reforma da Previdência e para rasgar a CLT, desvincular os recursos da saúde e da educação. Essas são ações que atacam violentamente o povo brasileiro. Cada vez mais os objetivos do golpe ficam evidentes, nunca foi contra a corrupção. Temer tem vários corruptos no governo. O que querem é liquidar o pré-sal e os direitos sociais”, disse.
 
Para o integrante da secretaria executiva da CSP-Conlutas Wilson Ribeiro, é possível lutar e vencer essa “figura ridícula” que é o presidente Michel Temer, que “parece saído de um filme B de terror”. “Mostramos hoje, com os professores à frente, que é possível derrotar esse projeto terrível desse governo golpista que só vai atacar a classe trabalhadora.”
 
O secretário-geral da Intersindical, Edson Carneiro, o Índio, lembrou que cresce a resistência à agenda do golpe, e que isso é visível nas ruas e nas empresas. “Essa agenda do Congresso e dos empresários quer acabar com os direitos garantidos na Constituição de 1988. Segundo ele, as mobilizações populares podem derrotar as propostas do golpe, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita os gastos públicos, e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257, que retira direitos trabalhistas. “Estamos mais fortalecidos, hoje ficou demonstrado isso. É preciso reduzir as taxas de juros, parar de transferir bilhões em dinheiro público para engordar o bolso dos banqueiros.”