Não permitiremos retrocessos em direitos para as domésticas, afirmam cutistas
Após muita pressão da CUT, da Confederação dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (Contracs) e da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), o Congresso Nacional promulgou no dia 2 de abril a Emenda 72/2013 à Constituição, que estendeu para as trabalhadoras domésticas os mesmos direitos das demais categorias.
Entre os avanços estão a garantia de jornada de oito horas diárias e 44 horas semanais, pagamento de horas extras e de, ao menos, um salário mínimo.
A conquista plena, porém, ainda depende dos parlamentares. Itens como indenização de 40% sobre o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço em caso de demissões sem justa causa,seguro-desemprego e adicional noturno aguardam a regulamentação, que passa pela avaliação de uma Comissão Mista de Consolidação das Leis formada por deputados e senadores.
Em encontro do Coletivo de Mulheres da CUT-SP, na manhã dessa sexta-feira (3), a deputada federal Janete Pietá (PT-SP), alertou que a Central deve fortalecer a pressão sobre o Congresso para impedir retrocessos.
“Precisamos cobrar o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que é presidente da comissão, para que não andemos para trás por conta de questões como a diminuição da multa sobre o FGTS”, comentou.
Diante do impasse provocado pela contrariedade dos movimentos sociais a questões como essa, a comissão resolveu aguardar o posicionamento do governo e a deputada ressaltou a necessidade de também dialogar com a ministra da Casa Civil, Gleise Hoffmann.
Para Janete, é preciso ainda cobrar a mudança do trecho da Constituição que trata das trabalhadoras domésticas. “Devemos lembrar ao deputado Henrique Alves (PMDB-RN) e ao senador Renan Calheiros(PMDB-AL), presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente, a necessidade de atualizarem o parágrafo 7º” citou.
Invisível e ainda precário
Fortemente marcado por vínculos informais, desvalorizado e invisibilizado. Esse ainda é o perfil do trabalho doméstico, uma profissão essencialmente feminina e marcada pela presença de mulheres negras.
Com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE, a coordenadora da subseção do Dieese na CUT, Patrícia Pelatieri, apontou que havia 6,6 milhões de pessoas ocupadas no emprego doméstico em 2011, sendo 93% mulheres (6,2 milhões). Dessas, 61% eram negras.
Em relação ao nível de escolaridade, houve melhora – em 2004, 9,6% eram analfabetas, por exemplo, contra 7,5% em 2011 –, fator que permite a inserção em atividades que exigem maior qualificação, mas que também pode significar uma nova exigência do mercado.
Sobre a contratação, houve diminuição das trabalhadoras mensalistas sem carteira assinada – de 57%, em 2004, para 44,9%, em 2011 –, mas não houve aumento de mensalistas com carteira assinada na mesma proporção. A explicação está no aumento de diaristas, que passou de 21,4% para 30,6% no mesmo período.
Enquanto a renda média real por hora cresceu 76,4% entre 2004 e 2011 (de R$ 2,49 para R$ 4,39) – para as diaristas foi ainda maior, 92,8% –, principalmente influenciada pela valorização do mínimo, a contribuição previdenciária é baixa e parte especialmente de quem tem carteira assinada: 34,9%, diante dos 5,7% sem carteira assinada.
“Isso significa que, mesmo no melhor cenário, 70% das trabalhadoras estão desprotegidas, sem assistência para o caso de se adoentarem e terem de sair do emprego”, afirmou Patrícia sobre um quadro que tem tudo para mudar com a emenda.
Quase um centenário de luta
Diretora Executiva da CUT, Rosana de Deus fez um resgate dos quase 80 anos de luta das domésticas, que ganhou fôlego com a aprovação da Convenção 189 e da Recomendação 201 da Organização Internação do Trabalho (OIT), em 2011. A norma trata dos direitos mínimos da categoria em todos os países, mas é um bom exemplo de como a profissão ainda enfrenta obstáculos para sua regulação.
“A CSI/CSA (Confederação Sindical Internacional e das Américas) lançou uma campanha chamada “12×12” para ratificar a convenção em 12 países no ano de 2012. Mas somente cinco fizeram e, a partir de agora, com Emenda 72, o Brasil precisa assumir esse compromisso porque é referência e vitrine na luta sindical e vai impulsionar outras nações a fazerem o mesmo”, avaliou, lembrando que o site da Central e de outras entidades ainda recolhe assinaturas para o projeto. Clique aqui para assinar.
A dirigente acredita que os próximos passos após a promulgação são manter os direitos conquistados, convencer a classe trabalhadora de que esse tema deve ser abraçado por todos, incluindo o conjunto de secretarias cutistas e fazer com que os dirigentes deem o exemplo, registrando suas trabalhadoras e apoiando a luta das domésticas.
“Assim como o feminismo não é algo resolvido no movimento sindical, os direitos das domésticas ainda encontra muita resistência. A emenda 72 é uma reparação a quem recebeu a herança da escravidão.”
Resistência ao avanço –Presidente do Sindicato das Trabalhadoras Domésticas de Franca e diretora da Fenatrad, Rosa de Jesus, afirmou que a categoria recebe pressão do governo federal par aceitar mudanças como a redução da multa de 40% do FGTS para a demissão imotivada e se emocionou ao questionar o motivo de não poderem ter os mesmos direitos dos demais empregados do país.
Na outra ponta, relatou a resistência e temor das companheiras diante das conquistas de direitos. “Enquanto muitas patroas vieram ao sindicato para saber como se adequar, algumas domésticas vinham reclamar, dizer que iríamos acabar com a categoria. Isso é por conta também do que vendem na imprensa, ao invés de informar, pregam o medo, fazem jogo sujo. A gente está lutando por igualdade, não podemos abandonar isso, em nome de todas aquelas que hoje estão doentes e sem amparo porque não tinham carteira assina, ou aposentadas, mas sem receber. Ou das que dormem no trabalho porque não pode ter vida própria, tem que cuidar o tempo todo do filho da patroa.”
Por fim, a secretaria de Mulheres da CUT-SP, Sônia Auxiliadora, avaliou que emenda vai além do direito legítimo à igualdade de direitos trabalhistas. “O debate sobre o compartilhamento de responsabilidades domésticas é o capítulo seguinte dessa história e, portanto, defendemos a ratificação da Convenção 156 da OIT – que trata do tema. A emenda é também uma questão de igualdade de gênero.”