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Postado em: 31/01/2011 - 14h12 | Rede Brasil Atual

Entrevista: Ferréz, o artista do Capão Redondo

Na carteira de identidade ele é Reginaldo Ferreira da Silva, mas todos o chamam de Ferréz, homenagem dele a outro Ferreira – o Virgulino, conhecido como Lampião – e a Zumbi dos Palmares, de quem tirou o Z.

O artista partiu do rap, tornou-se escritor e compartilha a própria fama com o lugar onde mora, o Capão Redondo: situado na Zona Sul paulistana, o bairro inspirou Capão Pecado e nunca mais foi o mesmo depois que o livro, escrito na linguagem da periferia, esgotou a tiragem em menos de um mês.
 
Ativista cultural, ele fundou a 1 da Sul, grife de moda apoiada nos artistas locais. Suas iniciativas transformaram o Capão em pólo cultural: saraus de poesia, bibliotecas, palestras em escolas, um selo editorial e outro para CDs de rap e uma revista – Literatura Marginal –, premiada pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), estão entre as realizações que surgiram de seu trabalho com a “molecada” do bairro, como gosta de dizer.
 
Premiado na literatura, Ferréz passou a ser consultado sobre educação, violência policial, desigualdade social, racismo.
 
Em 2005, foi convidado pelo PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – para participar do relatório da ONU. No mesmo ano, recebeu o prêmio Zumbi dos Palmares, da Assembleia Legislativa de São Paulo. Confira a entrevista que ele concedeu à repórter Juliana Torres.
 
Brasil Atual – Você se define como um artista, ou como um artista da periferia de São Paulo, da Zona Sul?
Um artista? Como assim? As pessoas se definem assim quando fazem algo artístico, no seu caso, escrevem… É, eu estou mais para autista. Tem essa letra diferente aí do “r” para o “u”. Eu acho que sou bem mais autista porque tenho vontade de construir um mundo próprio bem melhor.
 
Que tipo de influência você traz para as crianças e adolescentes do Capão Redondo?
Acho que é positiva. Acabei virando uma espécie de exemplo. As mães passam por mim com os filhos e dizem “olha, você tem que estudar, pra ficar inteligente assim”.
 
Como você avalia a polêmica  do livro Capão Pecado, indicado como leitura para estudantes da escola pública?
Alguns estados proibiram: Bahia, Minas Gerais. Algumas pessoas não entendem o propósito, né? Parece que as crianças precisam ler a Disney.
 
O rap ainda tem a mesma importância pra você?
Todo escritor tem que ter uma escola de linguagem, e a minha escola de linguagem é o rap, que me ensina gíria. Eu me considero do hip-hop também. Tem vários escritores que também tiveram movimento na música. Eu sou um cara que precisa disso, dessa música. E o rap é uma música mais real.
 
E o Instituto 1 da Sul?
Estamos montando um instituto para o ano que vem. A gente já tem projetos sociais há muito tempo, e tivemos essa ideia do instituto. O que a gente quer com o instituto é poder apresentar o bairro de uma forma legal, né? Estamos terminando de fazer o estatuto, tem muita gente legal.
 
Você tem algum parceiro neste projeto?
Tem o pessoal da Atitude Brasil, tem muita gente ajudando a gente, o próprio Alexandre de Maio também. E  vários empresários aqui da região que querem que o bairro melhore junto com a gente.
 
Você está escrevendo um livro novo e uma revista em quadrinhos. Pode falar um pouco sobre isso?
Estou escrevendo há seis anos esse livro novo, que se chama Deus foi Almoçar. Já deu muito trabalho, mas vou lançar este ano. A revista em quadrinhos, em parceria com o Alexandre de Maio, já tem vários anos que a gente está fazendo. Agora já é uma revista com mais de 150 páginas e a gente está entrando em contato com as editoras para publicar. A revista se chama Mil Fitas. Tem um lado criminal, mas fala bastante do lado humano dos caras, o lado problemático, de solidão também.
 
Como foi o lançamento de seus livros em países  como Portugal, França e Espanha?
É a nossa história. É a prova de que as pessoas se interessam pelo nosso convívio. Enquanto as pessoas aqui nos censuram, outras querem saber um pouco da nossa história.