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Postado em: 07/10/2010 - 14h42 | Rede Brasil Atual

E o Nobel foi para Vargas Llosa

O escritor peruano Mario Vargas Llosa tornou-se o sexto ou sétimo escritor latino-americano a ganhar o Premio Nobel de Literatura em 2010.

Sexto ou sétimo?
 
Pois é. Incluindo o peruano, outros cinco são indiscutivelmente latino-americanos: Gabriela Mistral (Chile; 1945), Miguel Angel Astúrias (Guatemala; 1967), Pablo Neruda (Chile; 1971), Gabriel Garcia Márquez (Colômbia; 1982), e Octavio Paz (1992; México).
 
O “outro” é o santa-lucense (de Santa Lucia, ilha do Caribe, ex-colônia britânica) Derek Walcott, que ganhou o prêmio de 1992.
 
Por que ele seria ou não seria latino-americano? Não seria porque a língua em que escreve majoritariamente não é de origem latina, é o inglês.
 
Mas seria, porque faz muito o conceito de “América Latina” deixou de ser “latino” apenas, e passou a incorporar o Caribe em todas as suas manifestações linguísticas, pelo seu indiscutível “acrioulamento”, para usar uma expressão importada do espanhol. É o caso da literatura de Walcott, um descendente de escravos.
 
Por isso, quando coordenei a parte de literatura da Enciclopédia Latinoamericana, da Boitempo Editorial, com organização geral de Ivana Jinkings e Emir Sader, incluí Walcott entre os autores recenseados. Para mim ele é latino-americano, uma vez que o conceito adquiriu conotações culturais e políticas que não se limitam à geografia ou ao universo linguístico de origem das línguas usadas.
 
Hoje se pratica literatura latino-americana nos Estados Unidos, por exemplo, como atestam alguns ganhadores do Premio Casa de las Américas, de Cuba, que segue sendo o mais importante do nosso continente. E também ela é praticada – agora pela internet – na África, Ásia, Oceania. Até na Antártida, com os relatos de viagem.
 
Vargas Llosa sem dúvida merece o prêmio. É um dos grandes escritores do mundo inteiro. Tornou-se muito controverso por suas posições políticas conservadoras nas últimas décadas, mas isso não deve nos fazer esquecer a qualidade de sua literatura nem a pertinência crítica que ela tem em relação a temas candentes do nosso continente, como o militarismo recorrente até não muito tempo atrás – e reincidente no caso de Honduras, por exemplo.
 
Vargas Llosa, ao escrever A guerra do fim do mundo, com base do episódio brasileiro de Canudos, também tornou-se um dos escritores continentais a derrubar o Tratado de Tordesilhas que muitos de nós ainda levam na alma. Não vai longe o tempo em que “latino-americanos”, de um lado e outro da linha imaginária que dividia o mundo em dois, eram apenas os “hispano-hablantes”.
 
Mas meu livro preferido do autor peruano segue sendo La ciudad y los perros, uma candente visão do mundo militar da nossa América Latina.
 
Fica o caso de que nós, brasileiros, não temos um Nobel na coleção, embora haja escritores que merecessem um prêmio desse peso no mundo editorial. Seria o caso de Machado de Assis, Guimarães Rosa, Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de Andrade e muitos outros.
 
Mas pertencemos a um mundo editorial pouco conhecido e de pouca penetração na Europa e nos Estados Unidos. Além de que boa parte do mundo editorial do “Norte” ainda nos vê por detrás da cortina ibérica. O primeiro escritor de língua portuguesa a ganhar o prêmio (que é dado desde 1901) foi José Saramago, em 1998. Rosa estava cotado para recebe-lo, em 1967, quando morreu (não sei se é uma regra fixa, mas o Nobel vem sendo dado a escritores vivos tão somente), alguns dias depois de assumir sua cadeira na Academia Brasileira de Letras.