As mulheres lutam para serem reconhecidas como sujeitos políticos e com direitos iguais
Não há como estabelecer na história da humanidade em que momento as mulheres começaram a ser tratadas como seres inferiores e menos capazes. O que temos são evidências de um período em que se vivia em igualdade de condições nas comunidades nômades e, por alguma razão, esse modo de vida se rompeu, provavelmente quando as comunidades desenvolveram a agricultura e se fixaram a terra dando início ao processo de acumulação de riqueza.
Nessa nova época as mulheres são confinadas ao espaço privado, mesmo que se reconheça a presença delas no trabalho no campo ou mesmo como artesãs, mas esse trabalho simplesmente se torna invisível.
Há uma resistência por parte de quem escreve a nossa história de não reconhecer o papel econômico das mulheres na formação das sociedades. É como se a sociedade tivesse se constituído apenas por homens e as mulheres, por sua vez, são lembradas por serem seres frágeis e pela sua falta de interesse pelos espaços públicos.
Um marco importante da luta por direitos iguais começa no século XVIII, com a formação das sociedades industriais e os ideais de liberdade herdados da Revolução Francesa. Nesse momento as mulheres defendem o direito ao voto, antes somente os homens brancos e libertos poderiam exercer a cidadania. As ideias liberais influenciaram a primeira onda do feminismo e as bandeiras de luta estavam restritas ao acesso às liberdades democráticas. Entretanto, os movimentos socialistas da época e as operárias da indústria nascente denunciavam suas precárias condições de trabalho e reivindicavam o acesso aos mesmos salários pagos aos homens, influenciando, assim, um conjunto de mulheres feministas que lutavam contra a exploração da classe trabalhadora e por direitos iguais.
Enquanto a primeira onda do feminismo luta pelos direitos das mulheres ao acesso à propriedade e direito ao voto, a segunda onda do feminismo, nas décadas de 1960 e 1970, se destacará pela luta para colocar fim à discriminação contra as mulheres no trabalho. O movimento era para garantir que as mulheres tivessem acesso igual à educação, ao emprego e, ainda, participação política, autonomia econômica e direito ao corpo.
Nas últimas décadas os debates foram avançando e, à medida que mais mulheres ingressavam no mercado de trabalho, novos temas foram ganhando relevância, como a dupla jornada de trabalho e a luta pelo reconhecimento do trabalho doméstico como parte da jornada de trabalho das mulheres.
À semelhança do que acontecia no século XVIII, as mulheres na atualidade continuam recebendo menores salários, a tarefa de cuidados dos filhos ainda é considerada atribuição delas e a maternidade muitas vezes é um obstáculo para aquelas que desejam continuar na carreira – as empresas resistem em contratar mulheres para determinadas funções ou ocupações por puro preconceito e o acesso a postos de direção está destinado apenas aos homens. A luta das mulheres segue bastante atual e, conforme elas avançam em algumas áreas, se intensificam as práticas de assédio moral e sexual e violência doméstica. Além disso, os postos de trabalho mais precários, mal-remunerados e com maior vulnerabilidade estão destinados às mulheres.
O acesso aos cargos políticos ainda está restrito ao sexo masculino, embora avanços importantes possam ser verificados nas últimas décadas, mas ainda são insuficientes para que se alcance uma verdadeira condição de igualdade.
Nada explica a situação de desigualdade que persiste em nossa sociedade se não entendermos que os homens de alguma forma se beneficiam dessa condição. É confortável que a mulheres permaneçam na tarefa de cuidados e de reprodução da vida, enquanto os homens se destacam nos espaços públicos.
Por isso, a organização das mulheres em espaços próprios é fundamental. Enquanto sujeitos políticos, somente as mulheres conscientes de sua condição serão sujeitos de sua própria libertação.
Marilane Oliveira Teixeira é economista, pesquisadora da Unicamp e consultora do Sindicato dos Químicos de São Paulo.