Salário mínimo: vitória do diálogo
A negociação histórica que resultou na definição do valor do salário mínimo deste ano e na antecipação do reajuste para abril é mais uma demonstração de que a disposição do governo do presidente Lula para o diálogo social é a melhor alternativa para resolver os grandes temas nacionais.
Por sua vez, o compromisso das centrais sindicais em discutir o valor do mínimo de maneira responsável revelou o amadurecimento necessário para consolidar uma gestão focada no social e o empenho de todos no sentido de melhor distribuir a renda e, com isso, reduzir as desigualdades sociais no país.
Todos os atores da negociação tinham consciência de que era preciso estabelecer o melhor mínimo possível, que coubesse no Orçamento e fosse sustentável. Para isso, foram realizadas várias reuniões, com acaloradas defesas de teses, que extrapolaram os limites da mesa de negociação e envolveram toda a sociedade num grande debate público. O valor do salário mínimo de R$ 350 é, de forma inconteste, resultado dessa negociação histórica, comprometida com a sustentação da economia e com a elevação da renda do trabalhador.
Mais do que registrar um expressivo crescimento real em relação a 2005 -da ordem de 13%, o maior índice alcançado desde 1995-, é preciso ressaltar que o poder de compra do novo mínimo é o maior dos últimos 25 anos. De janeiro de 2003 a abril deste ano, em termos de valor nominal, a variação do salário mínimo é de 75%.
É verdade que o aumento do salário mínimo causa grande impacto na economia. Porém, isso não se traduz só em gastos. Prova disso é que pelo menos sete Estados praticam salários mínimos superiores a R$ 350. As pequenas prefeituras que alegam dificuldades orçamentárias para pagar o novo salário mínimo, por exemplo, não computam em seus cálculos um fato extremamente relevante: o impacto que o aumento provoca na arrecadação e no dinamismo da economia. Esse dinheiro a mais impulsiona os pequenos negócios e o comércio local. E, na maioria dessas cidades, esses recursos são provenientes dos benefícios pagos pela Previdência e Assistência Social.
Mais do que de planilhas e números, estamos falando de pessoas, trabalhadores na ativa ou não, que terão maior poder de compra, o que gera, de imediato, melhoria na qualidade de vida do cidadão. Os números só ajudam para mensurar parte dessa melhoria. Senão, vejamos. Em janeiro de 1996, o salário mínimo comprava 1,23 cesta básica. Em março de 2003, pulou para 1,30. Atualmente, com o valor recém-aprovado, irá comprar 2,20 cestas básicas, ou seja, seu poder de compra quase dobrou. Esse resultado foi alcançado a partir de uma combinação do controle da inflação com a desoneração tributária.
O aumento de R$ 300 para R$ 350 irá beneficiar, direta e indiretamente, cerca de 40 milhões de cidadãos, sem considerar as demais pessoas da família. Desse total, 15,7 milhões são beneficiários da Previdência, que recebem aposentadoria, pensão ou benefício no valor de até um salário mínimo. Outros 24 milhões são trabalhadores que ganham mensalmente salário igual ou inferior à remuneração legal mínima, de acordo com dados da Pnad 2004 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).
Os 13% de recomposição real do novo salário mínimo adquirem importância ainda maior porque servirão de referência para a fixação do piso salarial das categorias profissionais. Nenhuma delas conquistou esse aumento nas negociações coletivas. Assim, os pisos salariais hoje inferiores ou iguais a R$ 350 têm agora a possibilidade de recuperar essa diferença. Com o novo mínimo, o poder de negociação coletivo ganha força.
Os percentuais de recomposição salarial, aplicados todo ano, representam apenas uma das iniciativas do governo para fortalecer a remuneração legal básica. A proposta maior é construir uma política de Estado, de longo prazo, que permita a elevação continuada e consistente do valor real do salário mínimo, independentemente das mudanças de governo.
Tal política só será viável se resultar de um grande processo de consulta e de negociação. Em agosto de 2005 foi constituída uma Comissão Quadripartite para a Valorização do Salário Mínimo, coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Participam da comissão representantes do governo federal – ministérios do Planejamento, da Previdência Social, da Fazenda, do Desenvolvimento Social, da Casa Civil, Secretaria de Relações Institucionais e Secretaria Geral da Presidência da República-, trabalhadores, empresários e aposentados, além de representantes convidados dos poderes públicos estadual e municipal. É a sociedade debatendo o futuro da distribuição de renda no país.
Esse é o nosso compromisso. E o resultado de todo esse processo será uma grande conquista, cujo protagonista maior é o povo brasileiro.
O artigo foi publicado na Folha de São Paulo, na página 3,no domingo, dia 29 de janeiro de 2006.