Gordos, magros e o Fome Zero
A Pesquisa de Orçamento Familiar (POF 2003) do IBGE é o mais completo mapeamento da situação alimentar já feito no país. Durante um ano, uma amostra representativa de domicílios foi visitada várias vezes.
Os dados mostram que brasileiros com mais de 20 anos inclui quase 3,8 milhões de pessoas com déficit de peso e outros 38,8 milhões com excesso, dos quais 10,5 milhões obesos. Os números impressionam, mas ninguém se lembrou de perguntar: e os restantes 133 milhões da população total de 175,8 milhões existente?
A mesma publicação que deu origem à divisão do país entre gordos e magros tem a resposta. E o que ela diz é que brasileiros com renda familiar inferior a um salário mínimo (R$ 200 na época da pesquisa) não consumiam sequer 1.900 kcal diárias, menos que o limite inferior recomendado. Ou seja, mais de 77 milhões de pessoas, praticamente o dobro do total de obesos, não dispõem de quantidade adequada de alimentos.
A insegurança alimentar atinge quase metade da população, se consideradas as três dimensões do conceito internacional de segurança alimentar: quantidade de alimento, qualidade nutricional e dignidade do acesso.
A verdade é que a má consciência brasileira nunca se relacionou bem com palavras como fome, pobreza e miséria. Essa indisposição contaminou o aparelho de Estado, parte da mídia e da elite, sempre refratárias em se enxergar na imagem invertida de seu privilégio. Desqualificar a decisão de implantar uma política de segurança alimentar faz parte dessa tradição.
Erradicar a fome e a insegurança alimentar é um atalho de justiça possível de alcançar, antes mesmo de corrigir a distribuição de renda num horizonte de longo prazo.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da diretoria do Sindicato